Imagem Blog

Em Terapia Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO

Por Arnaldo Cheixas
Terapeuta analítico-comportamental e mestre em Neurociências e Comportamento pela USP, Cheixas propõe usar a psicologia na abordagem de temas relevantes sobre a vida na metrópole.
Continua após publicidade

Aula de Psicologia com Chaves: o caso dos ganhos secundários

Quando alguém passa por uma situação difícil (doença, violência ou alguma perda) é natural que se fragilize por um tempo. Nesse intervalo, as atividades cotidianas ficam um pouco de lado. Mais tempo na cama, um pouco de manha e os cuidados e a atenção de quem está por perto são uma configuração temporária, compreensível e […]

Por VEJASP
Atualizado em 26 fev 2017, 23h10 - Publicado em 19 dez 2013, 19h37

Quando alguém passa por uma situação difícil (doença, violência ou alguma perda) é natural que se fragilize por um tempo. Nesse intervalo, as atividades cotidianas ficam um pouco de lado. Mais tempo na cama, um pouco de manha e os cuidados e a atenção de quem está por perto são uma configuração temporária, compreensível e até necessária para o enfrentamento e a recuperação frente ao revés. É assim mesmo que tem de ser.

Quando a pessoa não tem uma carência prévia por atenção e afeto, esse curso de eventos transcorre normalmente mas, se existem carências significativas presentes, pode ocorrer a aprendizagem de um padrão comportamental ruim, que serve para manter o que os analistas do comportamento chamam de ganhos secundários.

O que são os ganhos secundários? Num episódio do clássico seriado mexicano Chaves (Chavo del ocho no original) há um surto de catapora na Vila. Chaves fica se lamentando ao Sr. Madruga por ser o único não contaminado pelo vírus da doença. Como ocorreria a qualquer interlocutor que ouvisse tal lamento, Sr. Madruga se surpreende com desejo tão paradoxal. Mas Chaves explica melhor sua lamentação e seu desejo por “pegar” catapora: “É que uma vez me levaram para o hospital porque eu estava doente e em um só dia me deram de comer três vezes”. Eu não conseguiria explicar de maneira mais clara o que são os ganhos secundários. Estar doente é pior do que estar saudável mas pode trazer ganhos que são secundários à doença; no caso do Chaves, três refeições num único dia.

Cena de episódio do Chaves: (Foto: Reprodução)

Cena do episódio de Chaves: o personagem argumenta que gostaria de pegar catapora porque no hospital comeria três vezes por dia (Foto: Reprodução)

Continua após a publicidade

Além de alimento, podemos ter carência por afeto, atenção, cuidados etc. E, como o Chaves, também aprendemos a manipular as situações para obter ganhos secundários. Lembro-me de um caso atendido por um grupo do qual eu fiz parte. Um garoto de 5 anos produzia lesões em seu próprio corpo sem uma causa aparente: cortava a própria pele, arranhava-se com a tampa de uma caneta, além de outras formas de lesão. Aos poucos, descobrimos que ele aprendeu que, ao se machucar, passava a ganhar atenção dos pais, normalmente muito ausentes por conta de suas carreiras. O trabalho de intervenção foi principalmente com os pais, que aprenderam a oferecer atenção ao filho em momentos adequados (brincadeiras, estimulação cognitiva) e diminuíram (de forma planejada na terapia) a atenção aos seus comportamentos autolesivos.

A questão dos ganhos secundários nos ajuda a refletir sobre como nos comportamos em qualquer dos dois papeis, o de quem demanda atenção e o de quem fornece atenção. Em situações difíceis, devemos ter cuidado para não permitir que um contexto de ganhos secundários se cristalize e atrapalhe nossas vidas. Se o revés foi conosco, temos de ter cautela para não barganharmos atenção excessiva dos outros. Se o revés foi com alguém próximo, temos de ter cautela para não reforçar possíveis tentativas de barganha. Lembro-me do que dizia minha professora de Filosofia (Salete da Silva Alberti) durante suas aulas na Unesp: “Você pode ajudar alguém a caminhar até o toalete. Só que você não pode fazer xixi por ele/ela”.

Para a catapora já há vacina. Para ganhos secundários ainda não. Cuidado e boa sorte!

Publicidade

Essa é uma matéria fechada para assinantes.
Se você já é assinante clique aqui para ter acesso a esse e outros conteúdos de jornalismo de qualidade.

Domine o fato. Confie na fonte.
10 grandes marcas em uma única assinatura digital
Impressa + Digital no App
Impressa + Digital
Impressa + Digital no App

Informação de qualidade e confiável, a apenas um clique.

Assinando Veja você recebe semanalmente Veja SP* e tem acesso ilimitado ao site e às edições digitais nos aplicativos de Veja, Veja SP, Veja Rio, Veja Saúde, Claudia, Superinteressante, Quatro Rodas, Você SA e Você RH.
*Para assinantes da cidade de São Paulo

a partir de R$ 39,90/mês

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.