Quer saber mais sobre teatro? Clique aqui.
As cinco melhores peças do ano de 2015 em São Paulo
Crise, crise, crise… Se essa foi uma das palavras mais faladas em 2015, vamos tratar de teatro para que tudo ganhe uma nova conotação. Dirceu Alves Jr., crítico de VEJA SÃO PAULO, escolheu os cinco melhores espetáculos apresentados em temporadas nos palcos paulistanos em 2015. E eles são… “Um Bonde Chamado Desejo” De tempos em tempos, […]
https://videos.abril.com.br/script/vejasp/id/6bb6d666178465adf9c30b87af640594?w=590&h=332
Crise, crise, crise… Se essa foi uma das palavras mais faladas em 2015, vamos tratar de teatro para que tudo ganhe uma nova conotação. Dirceu Alves Jr., crítico de VEJA SÃO PAULO, escolheu os cinco melhores espetáculos apresentados em temporadas nos palcos paulistanos em 2015. E eles são…
“Um Bonde Chamado Desejo”
De tempos em tempos, um espetáculo perdura na memória do público como uma experiência vivida. Sob a essencial direção de Rafael Gomes, Maria Luisa Mendonça protagoniza o drama de Tennessee Williams (1911-1983) na pele de Blanche Dubois e entra para esse seleto time. Enigmática, falida e em estado de permanente delírio, ela é uma professora obrigada a morar de favor na casa da irmã, Stella (a atriz Virginia Buckowski). Por lá, uma batalha repleta de tensão sexual é travada pelo cunhado, Stanley Kowalsky (interpretado por Eduardo Moscovis), que decide investigar o passado renegado por ela. Uma leitura arrebatadora e atemporal de uma história escrita em 1947. A base para o sucesso, no entanto, se apoia na visceral representação de Maria Luisa. Em um transe permanente, a atriz descarta ficar limitada ao recorrente glamour e humaniza Blanche, valorizando a cada cena sua solidão e a óbvia sensação do fracasso. Fabrício Licursi, Fernanda Castello Branco e Matheus Martins completam o elenco.
“Urinal, O Musical”
Desta vez, o diretor Zé Henirque de Paula importou o original dos americanos Greg Kotis e Mark Hollmann para produzir um musical que, apesar do ambiente intimista do Núcleo Experimental, não deixou nada a desejar às superproduções do gênero. O tema da peça se faz tremendamente oportuno. Lançada na Broadway em 2001, a satírica história é centrada nos habitantes de uma cidade que enfrenta uma crise hídrica há duas décadas, resultado da escassez das chuvas. A população conta os tostões e paga banheiros coletivos controlados pela Companhia da Boa Urina (CBU). Quem desacata a lei é enviado para uma colônia penal. O elenco de catorze atores cantou sem o uso de microfones – algo raríssimo em musicais. Oito aparelhos espalhados pelo palco capturaram e valorizaram a voz de cada um. Cinco músicos sob a regência de Fernanda Maia deram o suporte.
“O Camareiro”
O clichê de que cada personagem deve ser encarado como uma folha em branco para o intérprete ter total liberdade de criação não se aplica nesse caso. A bem-sucedida trajetória de Tarcísio Meira e sua imagem de galã conferiram uma simbologia muito bem explorada à grandiosa encenação dirigida por Ulysses Cruz. No drama de Ronald Harwood, um icônico ator sente-se dominado pela exaustão e beira um colapso nervoso. Prestes a encenar pela enésima vez o papel-título da tragédia Rei Lear, de William Shakespeare, ele reluta em entrar no palco e trava um vertiginoso embate com seu fiel camareiro (vivido por Kiko Mascarenhas), inconformado com o desânimo do artista. Conceitos de vocação, egocentrismo e reponsabilidade vêm à tona para discutir os limites capazes de separar ficção e realidade. Karin Rodrigues, Chris Couto, Karen Coelho, Ravel Cabral e Silvio Matos formaram o competente time coadjuvante que ofereceram suporte para a dupla central.
“Consertando Frank”
Escrito em 2001 pelo americano Ken Hanes, o drama dirigido por Marco Antônio Pâmio pareceu ter saltado dos recentes noticiários para promover um amplo debate de ideias. Chico Carvalho interpretou o jornalista Frank Johnston, acostumado a abordar temas frívolos em suas reportagens. Persuadido pelo namorado, o psicólogo Jonathan (papel de Rubens Caribé), ele disfarça-se de paciente a fim de denunciar um terapeuta (representado por Henrique Schafer) que teria desenvolvido um método de reversão da homossexualidade. Não demora a perceber que em tudo há dois pesos e duas medidas e, muitas vezes, ele mesmo é vítima de manipulação em sua rotina pessoal. Se, à primeira vista, a sinopse sugere um prato cheio para despertar polêmicas ou levantar bandeiras, a montagem resultou em um painel abrangente sobre o comportamento humano. A falada “cura gay” foi só uma entre tantas questões retratadas por meio do equilibrado trio de atores.
“Fantasmas”
O ano de 2015 começou barra-pesada para o diretor Roberto Alvim e sua companhia, o Club Noir. A sede do grupo, no Baixo Augusta, não sucumbiu às dívidas graças a uma ação em um site de financiamento coletivo. A crise parece ter acelerado ainda mais a criatividade do artista, que já havia lançado nesse semestre dois belos trabalhos, Caesar – Como Construir um Império e O Balcão, e alcança a maturidade com a adaptação dessa tragédia escrita pelo norueguês Henrik Ibsen em 1881. Suas obsessões estéticas, como a iluminação difusa, quase na penumbra, estão equilibradas diante um afinado quinteto de atores e de uma história exigente, mas compreensível para quem se permitir prestar atenção nos diálogos. Na trama, uma viúva (interpretada por Juliana Galdino) projeta a inauguração de um orfanato em homenagem ao marido. O retorno de seu filho (representado por Mário Bortolotto), depois de longa ausência, e o embate com pastor corrupto (papel de Guilherme Weber) começam a desestruturá-la gradativamente. Por fim, a criada (a atriz Luísa Micheletti) entra em conflito com o padrasto (o ator Pascoal da Conceição) disposto a prostituir e, nessa atmosfera, os limites entre o delírio e a realidade se estreitam. Destaques do elenco, Juliana atribui a cada palavra um peso compatível às angústias da personagem, e Bortolotto, lapidado pelo diretor, surpreende até o público habitual de seus espetáculos.