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Por Arnaldo Cheixas
Terapeuta analítico-comportamental e mestre em Neurociências e Comportamento pela USP, Cheixas propõe usar a psicologia na abordagem de temas relevantes sobre a vida na metrópole.
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Xi, apaguei!

Regina é uma mãe dedicada! Cuida de seus dois filhos, Hugo e Fernando, com muito carinho e atenção. Ela é daquelas mães que não deixam escapar nada. Não quer que os filhos sejam privados de coisas que lhe possam gerar traumas. Um medo bastante presente para ela é o de não ser participativa. De tanto […]

Por VEJASP
Atualizado em 26 fev 2017, 21h50 - Publicado em 3 jun 2014, 21h16

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Regina é uma mãe dedicada! Cuida de seus dois filhos, Hugo e Fernando, com muito carinho e atenção. Ela é daquelas mães que não deixam escapar nada. Não quer que os filhos sejam privados de coisas que lhe possam gerar traumas. Um medo bastante presente para ela é o de não ser participativa. De tanto querer evitar a omissão, ela acaba se excedendo. Certo dia, ao caminhar em direção à porta para ir para a escola, Hugo (13 anos) deteve-se por um instante por pressentir que estava esquecendo algo. Regina lhe disse: “Seu lápis de desenho está na mesa da copa.” Hugo não precisou dizer nada. Ele apenas deteve-se por uma fração de segundo. Mas foi o suficiente para Regina sacar de que se tratava. Embora tenha sentido alguma gratidão pela mãe por ela ter solucionado seu problema, Hugo também sentiu um desconforto cujo motivo ele sequer sabia explicar. Ele caminhou em direção à copa olhando com gravidade para a mãe e disse um pouco contrariado: “Obrigado”.

Fernando, o caçula (10 anos), estava fazendo a lição de casa no seu quarto. Em certo momento, ele acidentalmente deixou sua régua cair no chão. Por ser de alumínio, a régua produziu um estalido quando tocou o chão. Novamente… antes que um segundo se completasse, Regina gritou da sala: “Tá tudo bem, Dinho?”. Enquanto ela gritava, Fernando dublava sua fala. Ele já estava habituado com a prontidão da mãe em resposta a qualquer barulho ou qualquer comportamento fora do habitual. Certa vez, ao passar pela porta do quarto dele, Regina o viu sentado à escrivaninha com a cabeça apoiada nas mãos. Ele só estava se concentrando na leitura da lição. Mas Regina, cuidadosa que é, não hesitou em se certificar: “Você está com dor de cabeça, filho?”. Fernando olhou para a mãe com a mesma expressão que Hugo fez no dia do lápis.

A intenção de Regina sempre foi boa mas não notava que sua preocupação ostensiva gerava marcas emocionais ruins nos filhos. Em outra ocasião marcante, a cama de Hugo amanheceu cheia de xixi. Regina ficou muito preocupada com aquilo e tratou de marcar um pediatra, um urologista e um terapeuta para o filho. Hugo foi contrariado e irritado a todas as consultas. Depois de algumas sessões com o terapeuta, Hugo conseguiu compartilhar o que aconteceu… mas Regina nunca soube. Naquela ocasião, Hugo acordou no meio da madrugada com vontade de ir ao banheiro. Bastaria ir, fazer xixi e voltar para a cama. Mas ele não foi. Ficou na cama avaliando se deveria ir ou não… porque ele sabia que, quando começasse a caminhar pelo chão de madeira, ouviria a voz firme vindo do quarto da mãe: “Tá tudo bem, filho?”. Por não conseguir decidir, pegou no sono. O desfecho a gente já sabe.

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Amigos, parentes e os próprios filhos passaram a alertar Regina para que lhes desse mais espaço. Depois de alguma reflexão, ela concordou. Mas mudar esse padrão é um desafio gigantesco para ela. Ela passou a prestar mais atenção e buscou evitar intervenções tão frequentes e tão imediatas.

Aos poucos ela está conseguindo transformar sua conduta. Mas vez por outra Regina ainda escorrega e repete o padrão. Fernando faz aniversário no mesmo dia do primo Beto. Neste ano Regina organizou uma festa conjunta. Cuidou de cada detalhe. Fez um enorme bolo de doce de leite. Nele colocou duas velas, uma para Fernando e outra para Beto. Quando terminaram de cantar “Parabéns pra você”, o priminho rapidamente apagou sua vela. Quando Fernando tomava ar para apagar a sua, alguém começou a puxar aquelas pequenas canções que sucedem o “Parabéns pra você”: “Com quem será… Com quem será…”. Hugo, por prudência e para prestigiar a homenagem complementar, resolveu não apagar sua vela até que terminassem de cantar. Mas a leitura de Regina não foi essa. A única coisa que ela podia perceber era a discrepância. Uma vela apagada, outra acesa. Será que isso vai gerar algum trauma em um dos dois? Ela não queria manifestar-se. Mas estava difícil. Uma gotinha de suor apareceu na sua testa de tão difícil que era não fazer nada. Por fim ela não resistiu e agiu para acabar com a discrepância. O mais marcante foi sua descrição constrangida depois de ter agido e aliviado sua tensão: “Xi, apaguei!”

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