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Corinthians: eternamente no meu coração

Por Casagrande
Atualizado em 5 dez 2016, 18h50 - Publicado em 30 abr 2010, 21h12

Escrever uma crônica sobre a visão que tenho do Corinthians é muito complicado — e complexo. Minha história com o Timão supera muito o que se pode dizer em um único texto. Talvez precisasse escrever um livro! Logo de cara, queria frisar que venho de uma família corintiana. O primeiro contato com o clube foi em 1970, em um jogo logo após a Copa do Mundo, no Parque São Jorge, contra a Ponte Preta (1 a 1, pelo Campeonato Paulista). Queria ver o Rivellino, que não jogou, e o goleiro Ado. A partir de então ocorreram coisas incríveis. Comecei a entender o que era o clube. Muito por influência do meu pai, Walter, que é tão corintiano, mas tão corintiano, que para ele o Corinthians até hoje nunca perde, apenas é roubado, prejudicado pela arbitragem. Esse corintianismo do meu pai me levou a um primeiro momento importante: 1972, semifinais do Brasileiro contra o Botafogo, no Maracanã. O Corinthians jogava pelo empate, mas perdeu por 2 a 1. O gol anulado de Baldochi — bem anulado, por sinal —, que, claro, foi contestado pelo meu pai, com todos os argumentos possíveis contra o juiz, me fez ver quanto o clube era importante para a minha família.

Ainda nessa época, veio a final de 1974 do Paulistão contra o Palmeiras, com dezenove anos sem títulos. Meu pai entra em cena novamente. Ele escutando o jogo pelo rádio e chorando após a derrota. Foi um fato que me deixou meio sem entender quanto o Corinthians mexia com as pessoas, com sua torcida. O tempo foi passando e me tornei jogador. Em 1975, meu pai arrumou um teste na Lusa, mas vi uma faixa na frente do Parque São Jorge anunciando peneiras. Não pensei duas vezes: deixei a Lusa de lado, fui, fiz o teste, passei e só comuniquei ao meu pai um mês depois, já treinando. Ali começava minha parte da história como profissional. Jogando pela categoria de base, percebi que a pressão dos anos sem título no profissional provocava uma cobrança também em nós, garotos. Comecei a ter dois sentimentos: o de torcedor e o de jogador. Era estranho cobrar como torcedor e ser cobrado como atleta. Dessa época vem uma das maiores lembranças da minha infância, inesquecível para todos os corintianos: a invasão do Maracanã, em 1976, na semifinal do Campeonato Brasileiro, contra o Fluminense.

Com 13 anos, eu não podia ir para o Rio de Janeiro, mas acompanhei tudo pela televisão e me emocionei demais. Comecei a ter reações como as do meu pai. Quando acabou a decisão por pênaltis, fui à casa de um amigo palmeirense, Bartolomeu, comemorar aquele fato inacreditável. Percebi que ali, além do jogador, estava presente o torcedor. Vi em mim o sentimento que movia meu pai. Observando a invasão e o resultado contra a Máquina Tricolor, aumentou a minha expectativa positiva, depois confirmada, de que o Corinthians logo, logo sairia da fila. Enfim, chegou o ano mais importante dessa relação em minha adolescência: 1977. O ano do título, do fim da fila. Como jogava no juvenil C, fiz várias preliminares e acompanhei no estádio muitos jogos daquela campanha. Por uma coincidência do destino, das três partidas finais contra a Ponte Preta, só fui à do recorde de público, que perdemos por 2 a 1 (146 000 pessoas, em 9 de outubro). Mas valeu muito a pena.

Esse título me deixou muito mais seguro. Eliminou o peso sobre todos os que trabalhavam no clube, do presidente ao porteiro. A partir daí minha relação com o Corinthians virou um casamento. Com emoções que iam do amor ao ódio. Isso ficou claro quando fui obrigado a sair para a Caldense, no primeiro ano como profissional, em 1981, por incompatibilidade com a então diretoria, comandada por Vicente Matheus, e com o técnico Osvaldo Brandão. Foi uma excelente experiência ter ido para Minas Gerais. Conheci outro mundo no futebol, fora do Corinthians. Serviu como amadurecimento, para que, na minha volta, eu tivesse a verdadeira noção do que era ser um atleta corintiano. E meu retorno não poderia ser melhor. Coincidiu com o início da “Democracia Corintiana”, uma situação política pela qual já lutava anteriormente. Dentro de campo, fiz minha estreia ser inesquecível marcando quatro gols contra o Guará (DF), numa vitória por 5 a 1. Logo depois, para consolidar minha relação com a torcida, fiz o que todo jogador sonha fazer com a camisa alvinegra: três gols num clássico de domingo contra o rival Palmeiras, no Morumbi. Nesse período fantástico da democracia ganhamos dois títulos — 1982 e 1983 —, e no primeiro deles marquei o único gol da minha carreira que homenageou alguém: a corintianíssima Rita Lee.

Nesse tempo todo de torcedor, com passagem para jogador, na minha pequena história dentro desse grandioso centenário, tive vários ídolos: Ado, Zé Maria, Rivellino, Roberto Miranda, Moisés, sem contar Wladimir e Sócrates, meus companheiros de time e democracia. Tenho também em minha memória jogos inesquecíveis: Corinthians e Ceará, em 1972, por exemplo, quando só a vitória interessava. E o Sicupira fez o gol da consagração, aos 46 minutos do segundo tempo, num Pacaembu lotado. Um detalhe é bem interessante nessa história toda. Talvez o jogo mais marcante de toda a minha carreira tenha sido no Pacaembu, com a presença da Fiel Torcida. Estava com outra camisa: a do Flamengo. Naquele domingo, no entanto, parecia que eu tinha voltado ao Corinthians. Senti um clima estranho já na chegada ao estádio. Até fiquei assustado, achando que não era comigo. Mas quando os times entraram em campo tive a certeza de que seria um jogo memorável e que eu seria o centro das atenções. De uma hora para outra, a torcida do Corinthians deixou de lado o time e passou a me ovacionar, o que durou os noventa minutos. Foi um comportamento como nunca vi na história. Fiquei meio desconcentrado.

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Em 2010, o Corinthians está fazendo 100 anos e eu, 47. Ou seja, não vivenciei nem a metade da história do clube. Mas o tempo que passei com o Corinthians e dentro do Corinthians deixou um sentimento que pode ser comparado a uma história de mais de 500 anos. Para resumir a importância na minha vida é necessário afirmar que nasci, cresci, amadureci e viverei para sempre sabendo que o clube estará eternamente no meu coração.

Ex-jogador, Casagrande é comentarista da Rede Globo

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