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Violência gratuita

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Por Walcyr Carrasco
Atualizado em 21 mar 2022, 14h28 - Publicado em 18 set 2009, 20h17

Recentemente, fui ao dentista. Na primeira consulta, a certa altura, o doutor Laércio, especialista em implantes, comentou:

 

– Eu não entendo o motivo de tanta violência.

 

Há algum tempo, implantou doze dentes em um paciente. O rapaz dirigia quando foi fechado por outro veículo. Brecou. O outro motorista saiu gritando, irritado por alguma manobra que ele havia realizado. Foi atacado com socos e chutes. Sem conseguir se defender, apanhou até depois de cair no chão. Mais tarde, em um hospital, constatou a perda dos dentes. Segundo Laércio, não foi o único caso. Muitas pessoas espancadas recorrem a ele para refazer a boca.

 

– O que me choca no que ouço é a falta de motivo para tanta fúria, concluiu.

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Não foi a primeira vez que ouvi sobre o assunto. Meses atrás um amigo estava com um casal e outro rapaz no vão do Masp, conversando na mureta. Um grupo de desconhecidos se aproximou, xingando. E partiu para cima deles. Não era assalto. Mas violência pura e simples. Perseguido por uma dupla, meu amigo disparou em direção à Fundação Getúlio Vargas. Quase alcançado, viu a porta da garagem de um prédio se fechando. Atirou-se lá dentro. Pensando se tratar de um assaltante, o porteiro gritou por socorro e se trancou na guarita. O rapaz quis explicar que fugia de agressores e precisava telefonar. Inútil. O homem chamou a polícia. Levado por uma viatura, só foi solto na delegacia onde seus amigos, machucados, prestavam queixa.

 

Já vi gente enfurecida na fila do check-in do aeroporto: certa vez uma passageira passou na minha frente louca da vida, gritou com a funcionária da companhia aérea, fez um escândalo. Temia perder o voo e não adiantou lhe explicarem que todos da fila embarcariam no mesmo horário. Não houve violência física, mas a mocinha do check-in foi chamada de idiota e estúpida! Os ataques corporais parecem cada vez mais frequentes. Uma conhecida assistiu a um desses episódios. Do outro lado da rua passavam dois garotos, aparentemente gays. Em sua direção vieram quatro skinheads. Sem aviso prévio, atiraram-se sobre os dois! Um voou para dentro de uma estação de metrô logo ali. Sob pontapés, o segundo conseguiu rolar também até a estação e se livrar. Há histórias de prostitutas atacadas por rapazes de classe média, a mais falada delas aconteceu há algum tempo no Rio de Janeiro. Para muitos moradores de rua, o espancamento é uma possibilidade cotidiana.

 

São comuns as brigas em casas noturnas, às vezes por causa de uma garota, outras sem razão nenhuma.

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O tema me dá angústia. Não consigo entender tantas explosões gratuitas de violência. Certa vez um amigo me deu uma lição de como se comportar nesse tipo de situação. Vínhamos de carro quando uma moto dobrou a esquina a toda a velocidade. Distraído, quase batemos, mas o acidente foi evitado. Mesmo assim, o motoqueiro nos perseguiu por vários quarteirões, xingando, a toda a velocidade. Finalmente, emparelhamos em um sinal. Meu amigo abriu o vidro e disse gentilmente:

 

– Desculpe. Eu não vi que você vinha. Sinto muito.

 

A gentileza desarmou o agressor: ficou mudo, imóvel. O sinal abriu. Fomos embora e ele tomou seu caminho. Não sou otimista a ponto de acreditar que esse tipo de atitude sempre resolve. Pelo contrário: no auge da raiva uma pessoa perde a capacidade de ouvir.

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Queria oferecer uma solução. Não sei qual. Como cidadão eu me sinto frágil e desamparado por não saber o que me espera quando dobrar a próxima esquina.

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