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‘Cinquenta Tons de Cinza’ não é nada erótico, diz Sasha Grey

Ex-atriz pornô que participou de mais de 270 produções fala sobre sua incursão no mundo da literatura erótica

Por Juliene Moretti
Atualizado em 5 dez 2016, 15h42 - Publicado em 21 ago 2013, 16h49

Ela decidiu explorar a própria sexualidade entrando na indústria pornográfica e atuou em mais de 270 filmes do gênero. Há quatro anos aposentada, Sasha Grey, fenômeno dentro e fora do mercado de filmes adultos, estreia agora como escritora. Juliette Society (Editora Leya), que chega este mês ao Brasil, já teve os direitos de adaptação para o cinema vendidos. O tema, claro, é o erotismo. A obra narra a história de uma estudante de cinema, Catherine, que se envolve em uma sociedade secreta de ricos e poderosos que usam o sexo como válvula de escape.

Alguma semelhança com o fenômeno de vendas Cinquenta Tons de Cinza? “Eu não acho que seja um livro que você deve ler, não acho nada erótico. Acho que cabe mais na categoria de romance. E tudo bem“, diz a nova autora, que conta ter usado muito das suas experiências na história. “É o que eu sou. Trazer as minhas experiências, minhas viagens, as pessoas que eu conheci, me ajudou a dar autenticidade ao trabalho”, contou à reportagem de VEJA SÃO PAULO.COM, durante sua breve passagem pela cidade.

Por que você desistiu dos filmes pornôs?  Eu acho que eu conclui todos os meus desafios como performer. Depois, eu estava com um sócio e montamos uma produtora, onde eu passei a produzir e dirigir meus próprios filmes. Em três meses, a gente divergiu. Eu queria fazer pornôs artísticos e ele, não. Eu tentei levar sozinha, mas comecei a receber convites para atuar em filmes e televisão e eu queria continuar fazendo isso. É impossível comandar sua própria empresa e aceitar e se comprometer com essas outras ofertas. É um trabalho de 24 horas por dia. Eu pensei, se for para desistir tinha que ser naquele momento, quando se está no auge como performer.

Por que você decidiu escrever o livro? Humm, eu sempre amei escrever. Eu faço desde pequena. Comecei a escrever peças quando tinha 16 anos com o meu mentor, Anthony D’Juan, e é uma coisa que eu sempre quis fazer, é uma das minhas paixões. E todo mundo me pergunta porque eu escolhi o erotismo como tema. Erotismo tem a ver com o que eu sou, minhas experiências, minhas viagens e as pessoas que conheci, tudo ajudou para que eu construir a história e trazer autenticidade ao trabalho.

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Você teve alguma inspiração? Sim, nesse livro específico, eu fiquei muito inspirada em The Sadeian Woman, da Angela Carter [livro de 1978, que explora o papel feminino nas obras de Marquês de Sade], Therese The Philosopher (publicado em 1748, de Marquês d’Argens, conta a história da iniciação sexual do jovem Therese), que não é muito conhecido e, claro, 120 Dias de Sodoma (Marquês de Sade, de 1904). Tem um, mais contemporâneo, que não me influenciou, mas acredito que seja importante na literatura erótica: Zonas Úmidas, de Charlotte Roche. Algumas pessoas podem ler e dizer que não é nada erótico, mas é engraçado, perturbador e ao mesmo tempo tão imaginativo que se você tem um humor mais sujo, vai rir muito.

O seu livro vai falar mais com mulheres ou quer também atingir os homens? Eu espero que os dois. Eu sei que você parte do principio de que apenas mulheres podem ler livros eróticos e fantasiar sobre isso. Mas eu queria fazer um livro divertido, com o qual as pessoas podem rir. E quando se fala de sexo, às vezes a forma mais fácil de se discutir de forma confortável, é fazer piadas com isso, é rir. 

E como está o projeto de transformá-lo em filme? Nós estamos no processo de tirar este projeto do chão. O problema é que é tudo tão demorado. Eles dizem que vão começar a gravar em junho e dois anos depois, você começa a gravar em janeiro. Vamos ver.

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Quem você gostaria que interpretasse Cathetine? Eu gostaria muito de ter a Mia Wasikowska [a Alice do filme de Tim Burton). Ela é uma atriz jovem e brilhante. Claro que eu pensei na Jennifer Lawrence, só que já estão falando dela para o Cinquenta Tons de Cinza, então roubaram a minha ideia. Eu apostaria mais na Mia porque ela tem um rosto muito inocente e ao mesmo tempo olhos fortes e atrevidos. Eu acho que ela faria muito bem.

E quem seria o diretor? Não tenho ideia. Ainda não consigo pensar em alguém.

Qual sua opinião sobre Cinquenta Tons de Cinza e seu sucesso? Eu não acho que seja um livro que você deve ler, eu não acho nada erótico. Acho que cabe mais na categoria de romance. E tudo bem. É um pouco estranho, como com o passar dos anos, a linha entre o erótico e o romântico desapareceu e as coisas são rotuladas e às vezes, elas não são aquilo.

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Você acredita que fantasias sexuais ainda são tabu? Sim, eu acredito que são. Especialmente para as mulheres que querem expressar sua sexualidade e serem mais abertas para isso. Ainda é muito difícil e por isso eu acho que Cinquenta Tons de Cinza é bom. Coloca esse tabu para ser discutido e permite que a cultura de massa fale sobre isso abertamente. 

E você não fez isso? Sim! É um dos motivos que eu entrei no mercado pornográfico: foi mostrar para as pessoas que não é preciso ter vergonha de sua sexualidade. Juliette Societty é só uma extensão disso. Isso sempre foi o que eu quis fazer e quero continuar fazendo.

O que privacidade significa para você? Eu acho que as relações e amizades. Especialmente agora que eu estou envelhecendo, não é sempre que você pode encontrar pessoas que você pode amar e confiar, apesar do sucesso que faz. Então, amizade e relações é um assunto que eu gosto de manter privado. É onde eu traço o limite. Colocar fotos da família na internet é algo que eu não faço, mas ao mesmo tempo, eu sou uma pessoa muito aberta em aspectos. 

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O que pode ser considerado uma invasão dessa privacidade? Quando eu conheço pessoas novas, às vezes eu sinto que a pessoa está me entrevistando [risos], e eu penso “Não vou conseguir me divertir com essa pessoa porque ela está me entrevistando”, é muito complicado.

As pessoas ainda têm muita curiosidade sobre a sua vida? É que eu não me importo em ser uma pessoa aberta ou falar sobre os meus interesses, não tenho problemas com isso. Mas quando eu sinto que a pessoa está calculando o que ela vai me perguntar, é diferente. Muda o tom de voz, muda a linguagem do corpo.

E como você faz para identificar se a pessoa está falando com você por interesse ou porque quer ser seu amigo? Acho que é instintivo. Todo mundo tem dentro de si, é um sentimento que você tem de que essa pessoa pode ser um bom amigo ou um bom amante. É algo que de repente se conecta e não é apenas com parceiros românticos, é com os amigos também. 

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Você voltaria a fazer filmes pornôs? Não, o pornô está morto de todo o jeito. A indústria pornográfica tradicional, assim como a música, estão num estágio muito difícil e o sistema e o jeito que está sendo feito mudou muito.

Você falou de exposição na internet, mas a internet também foi uma ferramenta que você usou para se promover. Não tem um lado bom? Bem, pode ser bom e ruim. Quando eu comecei, a indústria estava trabalhando de um jeito “normal”, eu peguei o fim dessa era. E, por causa da internet, eu consegui falar da minha carreira e dos meus interesses mas, por outro lado, as pessoas fazem download ilegalmente. Isso acontece com a música e com os filmes independentes.

E como está a sua carreira como atriz nos filmes não-pornôs? Ah, eu estou em um filme com o Elijah Wood, chama Open Windows. Aliás, eu estava na Espanha, onde eles me mostraram uma parte do longa. É interessante porque tem muitos efeitos especiais e eu acho que ninguém nunca tinha feito algo assim, ele é essencialmente efeitos especiais. Eles queriam lançar ainda este ano, mas dá realmente muito trabalho. Não vão conseguir até o próximo ano.

Você já assistiu a filmes pornôs brasileiros? Sabe que não? Mas muita gente nos Estados Unidos assistiu. E falam que as mulheres são lindas.

Você tem algum arrependimento? Não, nenhum. Eu acho que a minha principal frustração é ter começado a empresa voltada para o mercado pornô e ter falhado. Foi a minha primeira grande derrota na vida. Eu acho isso um saco e ainda fico muito brava comigo mesma. Mas como performer, e as pessoas que eu trabalhei são profissionais, eu sempre tomei as decisões que eu queria tomar. Ninguém tomou nenhuma decisão por mim.

Você sente falta de estrelar filmes adultos? Eu sinto falta da consistência. Pode parecer estranho mas era bom saber que aquilo era meu trabalho e o que eu fazia. Eu tinha motivação e tinha uma razão para fazer. E agora que eu faço um pouco de tudo, eu tenho a sensação de que eu estou num barco, indo e voltando. Acho que isso é uma sensação comum de todas as pessoas envolvidas no mundo do entretenimento, seja ator, escritor, músico.

E qual era a sua motivação? O principal motivo quando eu entrei era explorar minha sexualidade, porque eu tinha muita vergonha do que eu sentia e as coisas que eu queria fazer quando estava crescendo. Quando eu via pornografia, eu gostava e achava que era pecado. Então, eu quis desafiar a ideia do pornô e da mulher na pornografia, o que elas deveriam ser e como deveriam agir. Eu quero mostrar às pessoas que elas não devem ter vergonha do que elas sentem. Isso não significa “venha fazer pornô comigo”. Faz parte do que eu sou. Quando alguém curte o que eu fiz, se sente encorajado. Pode até se sentir envergonhado ou ficar com nojo, mas, depois, quando começa a ter a mesma fantasia e desejos e pode aprender algo novo comigo.

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