O que Resta do Tempo: drama com humor irônico
O diretor palestino Elia Suleiman relembra partes de sua trajetória no filme, de tom contemplativo
Numa época em que a montagem no cinema adquiriu a velocidade rápida do videoclipe, acompanhar uma fita contemplativa do diretor Elia Suleiman vira um convite ao prazer. Para quem ainda não ligou o nome à pessoa, vai a dica: israelense de origem palestina, ele despontou oito anos atrás após seu belo e poético Intervenção Divina levar o Prêmio do Júri no Festival de Cannes. Agora, no drama O que Resta do Tempo, retoma conflitos pessoais para abordar com fina ironia os conflitos entre árabes e israelenses.
O filme traz no prólogo uma metáfora instigante. Um taxista leva um passageiro do aeroporto para casa e, por causa de um temporal, não consegue encontrar o caminho. É como se o diretor apontasse o período nebuloso e sombrio que paira sobre Israel. São abertas, então, as memórias do realizador. De volta a 1948, ele lembra o pai, o palestino Fuad (Saleh Bakri), militante ativo contra a ocupação de sua Nazaré natal. Dá-se um salto para 1970 (Zuhair Abu Hanna), sofrendo os percalços de uma família árabe em estado majoritariamente judeu. Jovenzinho dez anos depois, Elia (Ayman Espanioli) toma consciência política e vê a saúde do pai deteriorar. No tempo atual, Elia (vivido então pelo próprio cineasta) reencontra a mãe, já doente, depois de longa ausência.
Em nenhuma das fases o personagem abre a boca. Trata-se da marca registrada dos trabalhos de Suleiman. Misto de Buster Keaton com Jacques Tati, ele carrega no rosto a expressão do espanto e do inconformismo. Seu cinema é feito de silêncios, situações surreais, sequências dramáticas e humor negro. Tudo muito bem combinado.