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Médicos querem proibir técnicos de prescrever lentes corretivas

Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) pretende acabar com velha prática de comprar óculos na farmácia

Por Camila Antunes
Atualizado em 5 dez 2016, 19h24 - Publicado em 18 set 2009, 20h33

A primeira-dama paulista, Monica Serra, não esconde que comprou seus inseparáveis óculos vermelhos numa farmácia no Chile. Assim como ela, milhares de paulistanos preferem escolher no balcão de uma loja, sem receita médica, as lentes que corrigem problemas visuais corriqueiros, como a chamada vista cansada. Uma campanha publicitária lançada na semana passada pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) pretende acabar com essa prática. Com o slogan “quem prescreve não pode vender, quem vende não pode prescrever”, os médicos querem cercar o território no qual atuam. Já conseguiram negociar com a multinacional Johnson & Johnson a interrupção do fornecimento de lentes de contato às drogarias. Agora partem para a fase de esclarecimento dos riscos de consultar um técnico numa ótica. “Quem será responsável por tratar de possíveis irritações ou de casos em que o uso de óculos mascara um problema maior?”, pergunta o oftalmologista Claudio Luiz Lottenberg, presidente do Hospital Albert Einstein.

De acordo com decreto federal antiqüíssimo, de 1934, somente aos médicos cabe a tarefa de indicar o uso de lentes corretivas mediante exame de acuidade visual. Por isso, é proibida no país a venda de óculos e lentes de grau sem a prévia consulta a um especialista. Muita coisa mudou, no entanto, nestes mais de setenta anos. Naquela época, os especialistas em olhos eram chamados de oculistas. Não havia a concorrência do optometrista, profissional treinado para fazer exames simplificados de visão, aqueles em que se devem identificar letrinhas a uma determinada distância. Há 300 optometristas trabalhando nas óticas de São Paulo – contra 1.870 oftalmologistas. A vantagem dos técnicos sobre os médicos é que, como eles atuam num esquema de venda casada, o teste muitas vezes sai de graça se o cliente mandar fazer os óculos no local. “O serviço de um optometrista é honesto e tem baixo custo para o atendimento primário da visão, ou seja, os casos em que um par de óculos resolve”, diz Carlos Suart, presidente do Conselho Regional de Óptica e Optometria de São Paulo.

Segundo a Associação Brasileira de Produtos e Equipamentos Ópticos (Abiótica), existem 3.000 óticas na cidade. Número superior ao de postos de gasolina (2 100) e ao de agências bancárias (2 000). Por ano, as vendas do setor óptico somam 8 bilhões de reais no Brasil. É esse mercado que os oftalmologistas querem proteger. “No Ministério Público federal correm 200 ações de oftalmologistas contra óticas que exercem a medicina ilegal”, afirma Harley Bicas, presidente do CBO. Independentemente da questão comercial, o consumidor deve estar atento às diferenças no atendimento prestado por um médico e por um técnico. Normalmente, os consultórios oftalmológicos têm mais máquinas que as óticas. Esses equipamentos são utilizados para avaliar detalhes do “fundo do olho”, como as condições de umidade e pressão. Isso quer dizer que só os médicos conseguem prever, por exemplo, se um paciente terá dificuldade para se adaptar a lentes de contato. Por sua formação de nove anos, entre a faculdade e a especialização, o oftalmologista está apto a detectar outros tipos de problema de saúde no teste da visão. Ele percebe, por exemplo, quando há condições para o desenvolvimento de doenças como diabetes e hipertensão – além de outras típicas da visão, como glaucoma e conjuntivite. Mesmo que um técnico seja muito experiente e detecte tais males, ele não pode dar o diagnóstico. Deve encaminhar o cliente a um especialista. Na Europa e nos Estados Unidos, a categoria dos optometristas conseguiu definir limites claros de atuação e conquistou metade dos clientes que têm problemas visuais, especialmente aqueles que seguem uma rotina de manutenção do grau. É essa possibilidade que os oftalmologistas brasileiros querem proibir.

Uma quadrilha especializada em roubos e furtos de equipamentos técnicos também vem preocupando os oftalmologistas paulistanos. Nos últimos dois meses, pelo menos cinco casos de assaltos a clínicas foram registrados pela polícia. Os ladrões procuravam por máquinas como o refrator, aparelho através do qual o paciente identifica letras a uma determinada distância, ou o oftalmoscópio, usado para exames no interior do olho. Por causa do crescimento desse tipo de ocorrência, o Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) enviou, em 27 de julho, uma carta ao governador José Serra pedindo providências. Três dias antes, uma clínica em Moema havia sido invadida pela segunda vez num período de duas semanas. “Acreditamos que uma só quadrilha seja a responsável pelos roubos, porque os produtos são muito especializados”, afirma Antônio Carlos Menezes Barbosa, delegado titular do 27º Distrito Policial, em Moema. “Possivelmente, há outras clínicas envolvidas na receptação desses equipamentos.” Segundo o delegado, as ocorrências estão sendo investigadas pelo serviço de inteligência da Polícia Civil. Pelas contas do CBO, apenas na cidade de São Paulo quarenta médicos associados foram vítimas de roubos e furtos em 2007. Um deles é o oftalmologista Omar Assae. Ao chegar ao trabalho, numa segunda-feira de janeiro, encontrou sua clínica vazia. “Os assaltantes desativaram o alarme e limparam tudo”, diz ele. “Só sobrou uma cadeira.” Segundo Assae, seu prejuízo foi de 50 000 reais.

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