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Guarapiranga e Billings: desmatamento, lixo e esgoto

Represas já perderam para os loteamentos clandestinos uma área quase do tamanho de 27 parques do Ibirapuera

Por Da Redação
Atualizado em 5 dez 2016, 19h23 - Publicado em 18 set 2009, 20h34

Há doze anos o padre Odair Agostin organiza em fevereiro uma espécie de procissão pela Represa Billings. Acompanhado de quinze pequenas embarcações e com a imagem de Nossa Senhora dos Navegantes em punho, vai de Riacho Grande, em São Bernardo do Campo, à Estrada Pereira Alvarenga, em Diadema. Ao desembarcar, reúne-se com cerca de 4 000 fiéis. Todos fazem uma caminhada de 1 quilômetro até a Igreja Nossa Senhora dos Navegantes, onde é celebrada uma missa. “Antigamente não precisávamos andar tanto porque a água vinha até a estrada, em frente à paróquia”, conta o padre Agostin. “O assoreamento reduziu o manancial.” Ele tem razão. Em vinte anos, a Billings perdeu 12 dos seus 120 quilômetros quadrados de espelho-d’água devido à poluição e às ocupações clandestinas. “Tento chamar atenção para esse problema. Quero ver a bacia limpa e cheia de peixes.” A situação é realmente preocupante. “Há cinco anos eu fisgava trinta carpas em um dia”, conta o pescador Julio Aguiar. “Hoje está difícil pegar uma.” A Billings é a maior represa da Grande São Paulo, responsável pelo abastecimento de 1,2 milhão de pessoas. Todos os dias, ela recebe cerca de 400 toneladas de lixo vindas de moradias irregulares que ocupam seu entorno. A Guarapiranga, represa menor mas responsável pelo fornecimento de água para 3,8 milhões de pessoas, também sofre com o esgoto. Cerca de 800.000 moradores residem na área da bacia, a maior parte de forma ilegal. “Temos de conter essa invasão”, diz Eduardo Jorge, secretário municipal de Verde e Meio Ambiente. No último dia 16, dezessete casas à beira da Billings foram demolidas. A iniciativa faz parte da chamada Operação Defesa das Águas, programa lançado em março pela prefeitura e pelo estado para a preservação da Guarapiranga e da Billings. A promessa é investir mais de 1 bilhão de reais para remover 5.340 famílias que ocupam 45 terrenos em mananciais – um pequeno começo diante dos 444 loteamentos clandestinos que existem na região. O porteiro Paulo Gonçalves da Luz, de 39 anos, foi um dos que assistiram ao seu sobrado de blocos cinzentos ruir. Há dois meses ele pagou 3.000 reais a um grileiro por um terreno de 75 metros quadrados na Cidade Ademar. Gastou outros 9.000 reais em uma das 1.200 lojas de material de construção que lucram com essa venda ilegal às margens do reservatório. “Não sabia que era proibido construir aqui”, diz ele, que pretendia morar na casa com três filhos. “Quero ver quem vai pagar o meu prejuízo.” Neste ano apenas um grileiro foi indiciado, segundo o delegado da Polícia Ambiental Pietrantonio de Araújo. “Prender uma pessoa dessas em flagrante é difícil”, admite Araújo. “E os moradores têm medo de denunciá-las.” Para se ter uma idéia, cada quilômetro quadrado da Billings e da Guarapiranga pode ser ocupado por até 5 000 pessoas. “O ideal seria imitarmos Nova York e permitir um máximo de dezenove habitantes por quilômetro quadrado nas áreas de mananciais”, diz o ambientalista Carlos Bocuhy, presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam). Com esse mundaréu de gente usando as represas de maneira irresponsável, a integridade de suas águas está cada vez mais comprometida, assim como a de outros nove reservatórios da região metropolitana. Mais da metade da água deles está em condições inadequadas para abastecimento público ou vida aquática, de acordo com a Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb). Quanto pior o estado da água, mais caro e difícil é seu tratamento. “A Sabesp investiu 58,5 milhões de reais no ano passado em produtos químicos para despoluição”, diz Dilma Pena, secretária estadual de Saneamento e Energia. Essa dinheirama é quase 10% maior do que o que se gastava três anos antes. Resultado: a conta de água também passou a pesar mais no bolso do paulistano (veja gráfico). O quadro é preocupante mas pode ser revertido: 37% da Guarapiranga permanece preservada, assim como 54% da Billings, com porções quase intocadas de Mata Atlântica. Neste ano, a Sabesp também começou a se preocupar em retirar o lixo que bóia nos mananciais, além de tratar do esgoto antes que ele caia nas represas. “Vamos limpar quarenta córregos”, promete Eduardo Jorge. E há bons exemplos de utilização do solo. No bairro de Riviera Paulista cerca de 200 famílias vivem sem danificar a bacia. De acordo com a subprefeitura de M’Boi Mirim, são exemplos de ocupações que convivem bem com o meio ambiente. Na margem oposta a essas casas, fica outro modelo a ser seguido. O Yacht Club Santo Amaro é um dos cinco clubes federados de vela da represa. Cerca de 750 esportistas velejam ali. Sem contar os praticantes de wakeboard, jet ski e pilotos de lancha. Há fins de semana em que as represas recebem até 10 000 banhistas. Foi na Guarapiranga, por exemplo, que o bicampeão olímpico Robert Scheidt começou sua carreira. “Velejo aqui desde os 6 anos. Acho lamentável que essa paisagem seja destruída.”

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