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Caso Vila Leopoldina: a vida das famílias depois da tragédia

Passada uma semana da morte do casal de namorados pela mãe do garoto, o pai da jovem se conforta no espiritismo; o do rapaz, no carinho dos parentes que restaram

Por João Batista Jr. e Nataly Costa
Atualizado em 5 dez 2016, 15h09 - Publicado em 14 mar 2014, 19h46

O cardiologista Mário Rodella Jr. e a pediatra Viviane Rodella atuam na saúde pública e particular há mais de vinte anos. Casados, pais de três filhos, moram em São José do Rio Pardo, a 250 quilômetros da capital.

À primeira vista, parecia uma família semelhante à de outro casal de médicos, estes da Zona Oeste de São Paulo: a também pediatra Elaine Moreira Munhoz atendia crianças e mães na Unidade Básica de Saúde de Alto de Pinheiros. O cirurgião Alexandre dos Santos Landini, seu marido, especialista em aparelho digestivo, mantinha consultório particular no Itaim e chefiava a residência médica do Hospital do Campo Limpo.

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O que ligava os dois sobrenomes se tornou conhecido em todo o país na manhã de sexta-feira (7) com uma tragédia na Vila Leopoldina. Mariana, filha dos Rodella, e Giuliano, dos Landini, namorados havia seis anos, foram assassinados a tiros. A autora dos disparos: a pediatra Elaine, mãe do rapaz, que se suicidou em seguida, segundo a hipótese consensual para a polícia, parente e amigos.

 

Em um aparente quadro de depressão, Elaine atirou primeiro com um revólver de calibre 38 em Mariana, a quem atribuía o mau desempenho universitário do filho, que deixava claro aos amigos suas incertezas sobre a vocação profissional. Ambos cursavam faculdade de medicina. Ele estava no quarto ano da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa, e, após reprovar em algumas disciplinas no ano passado, trancou a matrícula para o ano letivo de 2014, o que foi um baque para a mãe, que lhe dava uma atenção às vezes tida como obsessiva.

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Mariana, por sua vez, seguia firme no quinto ano da Universidade Santo Amaro (Unias). Faísca, como era conhecida pelos colegas, logo entrou para o Centro Acadêmico Rubens Monteiro de Arruda (Carma), onde era responsável pelos departamentos de Política Externa, Intercâmbio e Extensão Científica e Cultural.

Consumada a tragédia, os pais de Mariana têm se consolado nos braços dos dois irmãos dela. Para Alexandre Landini, que tinha Giuliano como único filho, o apoio vem de outros parentes. Na última semana, VEJA SÃO PAULO procurou os três, que não quiseram conceder entrevista. Pessoas próximas relataram a história do casal e como estão tentando viver após a tragédia.

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Perto do altar

Mariana e Giuliano namoravam fazia seis anos, desde a época de vestibular. O namoro era típico de dois jovens de 25 anos: eles frequentavam festas dos amigos da medicina, aniversários de família, viajavam para o litoral nos feriados. Há quatro anos, ela o levou para conhecer sua “família” do intercâmbio que fizera na Nova Zelândia. Ele também visitava os parentes dela no interior e a levava para dormir em casa, na Vila Leopoldina, de vez em quando. No Carnaval, ela foi para o Rio com amigas de São José de Rio Pardo, onde aproveitou os blocos de rua. Ele se isolou em um retiro budista, no interior de São Paulo. Nada indicava, porém, que havia uma crise no relacionamento. Aos amigos, mencionavam a intenção de se casar, uma ideia que incomodava Elaine de forma crescente.

“Sem julgamentos perversos”

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Com o crime repentino, a rotina das famílias agora segue caminhos bem diversos. O cirurgião Alexandre Landini está afastado do trabalho. Seus pacientes são atendidos por outros dois médicos com quem divide consultório no Itaim, na Zona Sul. Sem conseguir dormir no apartamento da Vila Leopoldina, que segue fechado, e se revezando na casa dos dois irmãos, tem também o apoio de uma cunhada e dos pais de Elaine.

Na missa de sétimo dia do filho e da mulher, familiares e amigos próximos fizeram fila para abraçá-lo. Sempre de olhos marejados, Alexandre tentava esboçar um sorriso ao ver os conhecidos, mas desabava a chorar ao ouvir as palavras de consolo. No santinho entregue aos presentes na missa, um texto longo, escrito por uma prima de Elaine. Um trecho: “Ser solidário é manifestar espírito elevado, não permitindo julgamentos perversos e equivocados”. 

Mesmo abalado, na quarta-feira (12), Alexandre foi até a UBS Alto de Pinheiros devolver alguns prontuários que estavam com a mulher. Cumprimentou amigos de longa data de Elaine, que trabalhava ali havia oito anos. Na unidade, não param de chegar flores – arranjos simples, de pacientes humildes, principalmente mães ou futuras mães que tinham a gravidez acompanhada por Elaine. Era descrita como uma pediatra disponível, atenciosa, caridosa. “A gente achava a vida dela perfeita”, conta uma das colegas. “Ela trabalhava por amor, não precisava de dinheiro.”

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Elaine sempre falava sobre o filho, a quem incentivava a gostar de medicina e tentar seguir os passos do pai na área de cirurgia. Não raro, Giuliano assistia às operações feitas pelo pai. Pouco entusiasmado com a profissão, foi mal no último ano e chegou a ser reprovado em algumas disciplinas, até trancar a matrícula.

Espiritismo e aceitação

Em Rio Pardo, o cardiologista Mário Rodella Jr. não deixou de atender em seu consultório particular e também retomou os atendimentos no principal posto de saúde da cidade. Já a mãe, Viviane, não sai de casa. Colegas de trabalho do posto de saúde pediátrico onde ela dá expediente afirmam que pediu afastamento. “Por serem funcionários públicos há mais de vinte anos, a cidade inteira ficou comovida e tocada com essa tragédia”, avalia João Batista Santurbano, prefeito da cidade. “No enterro, vimos funcionários da prefeitura, pacientes deles, amigos e pessoas que apareceram para desejar força.”

No dia do sepultamento, o pai de Mariana distribui aos presentes o texto religioso Joias Devolvidas, de Richard Simonetti. O trecho inicial da obra diz: “Existe uma palavra-chave para enfrentarmos com serenidade e equilíbrio a morte de um ente querido: submissão. Ela exprime a disposição de aceitar o inevitável, considerando que, acima dos desejos humanos, prevalece a vontade soberana de Deus.” O médico é espírita há anos; sua mulher, católica. “Ele faz palestras aqui e começou recentemente a auxiliar nas cirurgias espirituais sem cortes”, diz Sueli Perri Satores, fundadora do Lar Socorrista Antônio Luís.

Na terça (11), Rodella manteve a palestra que daria no centro espírita Cáritas, cujo tema era ciência e religião. Abriu a apresentação com um testemunho sobre o ocorrido. Disse da importância da aceitação e de se evitar a busca por explicação – pois alguns acontecimentos seriam inexplicáveis.

Rodella costuma indicar livros espíritas para alguns de seus pacientes. Perto de seu consultório particular, há uma banca de livros chamada Chico Xavier. Há um mês, ele pediu para sua secretária comprar um volume para dar de presente a um amigo. O título escolhido por ele foi Memórias de um Suicida, de Yvonne do Amaral Pereira, que discorre e conforta a respeito de tragédias assim.

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