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Os avanços relacionados a irregularidades das obras das ciclovias

A inauguração da pista da Paulista e como andam as investigações sobre os problemas da malha para bicicletas na capital

Por Aretha Yarak
Atualizado em 1 jun 2017, 16h45 - Publicado em 3 jul 2015, 23h00

Inaugurada no último dia 28, a ciclovia da Avenida Paulista foi recebida com festa por milhares de pessoas. Tamanha aglomeração chegou a sobrecarregar os sistemas de locação de bicicletas na região. Quem quis alugar uma bike teve de procurar uma alternativa longe dali. Para acomodar tanta gente, a pista foi fechada ao trânsito de carros das 10 às 17 horas.

A experiência serviu como um teste para a proposta de vetar a entrada de automóveis na via aos domingos. A comemoração contou com a presença do prefeito Fernando Haddad e dos secretários municipais Eduardo Suplicy e Gabriel Chalita. “É uma tendência internacional de grandes cidades reservar espaços públicos para que pedestres e ciclistas se encontrem, para que haja uma maior aproximação entre as pessoas”, discursou Haddad.

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O novo circuito da Paulista tem 2,7 quilômetros de extensão, em um traçado que vai da Praça Oswaldo Cruz à Avenida Angélica. Com a via, a cidade soma atualmente 334,9 quilômetros de malha cicloviária e se aproxima de atingir a metade 400 quilômetros até o fim do mandato de Haddad, 2016.

O mesmo não ocorre com outras de suas plataformas de campanha. Na eleição, ele se comprometeu a fazer 243 creches. Entregou apenas trinta, de acordo com a última atualização do Programa de Metas, e já assumiu que vai conseguir executar no máximo mais 117. Dos corredores de ônibus, somente 5,1 quilômetros estão prontos (de um total de150 previstos). Outro programa importante, a construção das Unidades Básicas de Saúde (UBS) também anda em ritmo lento. Foram entregues quatro das 43 prometidas.

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As ciclovias avançaram rapidamente na cidade em meio a uma série de polêmicas. Uma delas envolve seu custo. Como mostrou uma reportagem de capa de VEJA SÃO PAULO em fevereiro, as pistas para bicicletas de Haddad custam em média 650 000 reais por quilômetro, computando-se os 116 milhões de reais gastos nos primeiros 177 quilômetros. Na comparação com obras semelhantes de outros países, as daqui estão entre as mais caras do mundo.

O prefeito reagiu na época, dizendo que a conta estava errada. Segundo ele, o projeto da Paulista, orçado inicialmente em 12,2 milhões de reais (ou 4,5 milhões por quilômetro), inclui melhorias como a instalação de gradis de proteção e o aterramento de fios. Na visão do prefeito, deveria só ser contabilizado como custo da ciclovia o dinheiro investido na pista vermelha. Trata-se de um argumento com problemas, pois todas as adequações na Paulista foram realizadas exclusivamente com o objetivo de viabilizar a ciclovia.

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No exterior, vale a regra de computar no valor de uma obra desse tipo todas as intervenções necessárias para pôr em operação o circuito. Além do preço, a forma como o serviço foi contratado em São Paulo chamou a atenção do Tribunal de Contas do Município(TCM). Sob a responsabilidade de Edson Simões, vice-presidentedo órgão fiscalizador, uma auditoria realizada no projeto das avenidas Paulista e Amaral Gurgel apontou o uso incorretoda Ata de Registro de Preços para a contratação das empresas encarregadas das obras. Essa ferramenta serve para viabilizar lotes de compras menores do município, como o material de escritório para as repartições públicas. A aplicação da ata para obras do porte dessas ciclovias é considerada irregular.

O trabalhode Simões também apontou erros como a ausência de um projeto básico de engenharia, essencial para calcular orçamento e demanda. A prefeitura entregou no fim do mês passado os últimos documentos em sua defesa, que devem ser analisados ao longo das próximas semanas. Responsável pela ciclovia da Paulista, o Consórcio Semafórico Paulistano foi registrado na Junta Comercial cerca de sete meses antes do início da obra.

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Uma segunda auditoria no TCM, que corre em paralelo ao trabalho de Edson Simões, encontrou graves indícios de sobrepreço no trecho instalado na Avenida Professor Fonseca Rodrigues e na Rua Pedroso de Moraes, entre a Praça Apecatu e a Avenida Faria Lima. Conduzida pelo conselheiro-corregedor Domingos Dissei, a análise revelou que, dos 5,6 milhões de reais já pagos, apenas 600 000 seriam justificáveis. Ou seja, se comprovado, o prejuízo aos cofres públicos ficaria em 5 milhões de reais.

Dissei solicitou explicações detalhadas à prefeitura e à empresa Jofege Pavimentação e Construção Ltda., responsável pelo serviço. As respostas, que somam seis volumes de documentação, memórias de cálculo e plantas de implantação, foram entregues na última semana de junho e estão em estudo. O trecho passará ainda por uma avaliação técnica dos peritos do TCM, que consiste na coleta de amostras para averiguação em laboratório da qualidade e da espessura da pavimentação.

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Se não bastasse, Haddad tem pela frente outras duas investigações do Ministério Público. Desde setembro do ano passado, a promotora de Habitação e Urbanismo Camila Mansour está debruçada sobre o assunto e terminou dois laudos técnicos detalhados. Em ambos, foram encontradas irregularidades como a ausência de estudos sobre demanda para a construção das ciclovias e falhas na execução.

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Em17 de março, a promotora pediu a paralisação de todas as obras. O juiz Luiz Fernando Guerra, da 5ª Vara da Fazenda Pública da capital, acatou parcialmente a liminar, liberando apenas a continuidade da Avenida Paulista. Dez dias depois, o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, José Renato Nalini, suspendeu a liminar e permitiu a retomadadas demais construções. Camila Mansour está recorrendo da decisão.

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Outra promotora do MP, Karyna Mori, abriu inquérito em março para analisar a forma de contratação das empresas e o planejamento financeiro do projeto. A lista de fatos surpreendentes relacionados às ciclovias não para de crescer. Em documento enviado recentemente ao TCM, a prefeitura assumiu não ter dinheiro disponível em caixa para pagar o início das obras das avenidas Paulista e Amaral Gurgel. Mesmo assim, os trabalhos foram tocados.

A empresa responsável, o Consórcio Semafórico Paulistano, só recebeu os primeiros pagamentos em maio. Procurada por VEJA SÃO PAULO, a companhia não quis falar sobre o assunto. Em nota oficial, a prefeitura disse que “os recursos estavam previstos, porém congelados, devido ao início do exercício orçamentário”.

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Especialistas estranham a forma como o negócio foi feito. “Trata-se de uma demonstração de má gestão financeira”, afirma Floriano de Azevedo Marques, professor de direito administrativo da USP. No mês passado, o governo municipal realizou aditivos aos contratos que diminuíram de 12,2 milhões de reais para 10,4 milhões de reais o custo da ciclovia da Paulista. O preço dos serviços da pista da Amaral Gurgel também teve queda (11,4%). Sobre isso, a prefeitura afirmou apenas que “a redução se deve à readequação dos projetos”, sem detalhar quais alterações foram feitas.

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Obstáculos legais

As principais investigaçõesrelacionadas aos problemas damalha para bicicletas na capital

MINISTÉRIO PÚBLICO DE SÃO PAULO

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Promotoria de Habitação e Urbanismo: com base em um extenso e detalhado laudo técnico, a promotora Camila Mansour constatou uma série de problemas, como a falta de projeto de engenharia para essas obras e a ausência de estudo de demanda para definir os locais que receberiam traçados do tipo. Com base nisso, ela pediu a paralisação das construções em 17 de março. A Justiça interrompeu os trabalhos, exceto os da Avenida Paulista. Dez dias depois, a liminar foi derrubada e os serviços, retomados. A promotora recorreu dessa decisão e o caso aguarda a decisão final do Tribunal de Justiça.

Promotoria do Patrimônio Público e Social: inquérito civil foi aberto em março deste ano pela promotora Karyna Mori para analisar a forma de contratação das empresas e os procedimentos administrativos (como o pagamento das obras). A investigação ainda está em fase de recebimento da documentação. Ela teve início após a publicação da reportagem “O valordas pedaladas”, de VEJA SÃO PAULO, no dia 11 de fevereiro, que elencava uma série de problemas no programa de Fernando Haddad. Engrossaram a denúncia uma representação do vereador Gilberto Natalini sobre o custo das vias e o processo da Promotoria de Habitação e Urbanismo.

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TRIBUNAL DE CONTAS DO MUNICÍPIO

Ciclovia Faria Lima: auditoria conduzida pelo conselheiro Domingos Dissei encontrou justificativa para apenas 10% dos 5,6 milhões de reais que já foram gastos no trecho instalado na Avenida Professor Fonseca Rodrigues e na Rua Pedroso de Moraes, entre a Praça Apecatu e a Avenida Faria Lima. A empresa Jofege, responsável pela obra, e a prefeitura enviaram explicações, que ainda estão em análise pela corte.

Ciclovias das avenidas Paulista e Amaral Gurgel: auditoria finalizada no começo do ano apontou diversas irregularidades, como contratações incorretas e a inexistência de projeto básico, fundamental para o início das obras. Estão em análise ainda as planilhas de pagamentos e a execução das obras. A prefeitura enviou nas duas últimas semanas de junho documentos, que estão em estudo.

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