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Roberto Minczuk fala sobre apresentação da OSB na Sala São Paulo

Maestro paulistano comenta o repertório da próxima récita da orquestra na cidade, marcada para domingo (13)

Por Jonas Lopes
Atualizado em 5 dez 2016, 15h36 - Publicado em 7 out 2013, 18h04

Compositor que não teve o reconhecimento merecido enquanto era vivo, Anton Bruckner (1824-1896) perdeu a chance de ver sua reputação crescer imensamente ao longo do século XX. A maioria dos principais regentes dos últimos 100 anos – Wilhelm Furtwängler, Karl Böhm, Eugen Jochum, Rafael Kubelik e Herbert von Karajan, entre outros – fizeram questão de gravar sua produção, centrada em nove sinfonias e em algumas missas e outras obras corais. Sobretudo na produção sinfônica, Bruckner alcançou um equilíbrio impressionante entre a grandiosidade expressiva de Richard Wagner, seu grande ídolo, a clareza do classicismo vienense e a arquitetura baseada em contrapontos típicos do período barroco, em especial Bach. Um dos principais entusiastas do austríaco no Brasil é o maestro paulistano Roberto Minczuk. Depois de fazer uma excelente Sétima Sinfonia à frente da Orquestra Sinfônica Brasileira no ano passado (contando com a participação luxuosa de Stefan Dohr, trompista da Filarmônica de Berlim e maior nome do instrumento em atividade), Minczuk comanda a mesma OSB na Quarta Sinfonia neste domingo (13), às 17h, em récita na Sala São Paulo.

A apresentação tem participação do violoncelista pernambucano Antonio Meneses, um dos instrumentistas brasileiros mais conceituados na Europa. Ele sola no Concerto para Violoncelo em Mi Menor Op. 85, do inglês Edward Elgar. Meneses tocou essa peça pela primeira vez na década de 80, ao lado da Sinfônica de Londres, sob a batuta do mítico maestro italiano Claudio Abbado. Completa o repertório uma peça curta do contemporâneo estoniano Arvo Pärt, intitulada Silouans Song.

De Calgary, no Canadá, onde é regente titular da filarmônica local, Roberto Minczuk, de 46 anos, falou pelo telefone sobre o concerto paulistano.

VEJA SÃO PAULO — Bruckner é um compositor constante em seu repertório. O que o atrai tanto nas sinfonias dele?

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Roberto Minczuk — Ele é um compositor essencial, e não são muitas as orquestras que o tocam bem. A sonoridade da produção do Bruckner é muito especial, mas precisa ser desenvolvida aos poucos. As sinfonias têm uma transparência semelhante à de Haydn ou Mozart, por exemplo. Para mim, a principal razão para colocá-lo nos repertórios é lapidar o som da orquestra, pois é preciso trabalhar todos os naipes com intensidade para alcançar o som escuro e homogêneo necessário para alcançar um bom resultado. Isso exige muita disciplina musical. Bruckner foi além de seu tempo, influenciou muito o Mahler e, num certo sentido, marcou até os minimalistas contemporâneos. E há na biografia dele um aspecto religioso, presente, aliás, na vida de todos os grandes compositores austro-germânicos do século XIX. Sua música tem um potencial transcendental e, ao mesmo tempo, é moderna: ouvimos traços dela, por exemplo, em efeitos de trilhas sonoras de filmes de ficção científica.

Qual das várias edições da Quarta Sinfonia [Bruckner retrabalhava exaustivamente suas obras, e há várias versões diferentes delas] você decidiu adotar no concerto? A de Robert Haas, mais tradicionalmente utilizada [nomes como Bernard Haitink e Daniel Barenboim a utilizam hoje em dia, por exemplo]. O compositor aperfeiçoou bastante essa edição.

Tem preferência pela interpretação de Bruckner de algum maestro específico? Sou um seguidor assumido de Kurt Masur [Minczuk foi músico de Masur quando era trompista da Orquestra Gewandhaus, de Leipzig, no fim dos anos 80, e posteriormente foi regente associado do maestro alemão na Filarmônica de Nova York], acho as leituras dele incríveis. Eu me lembro de quando cheguei à Filarmônica de Nova York e conversei com um violinista veterano que estava há décadas lá. Embora tenha tocado até com Bruno Walter e Leonard Bernstein, ele me disse que a orquestra realmente aprendeu a tocar Bruckner apenas com o Masur. Muitas vezes as pessoas têm dificuldade com as sinfonias, acham longas e cansativas, mas o desafio é encontrar a fluência ideal de andamento, e acho que o Kurt Masur consegue isso. Tenho orgulho de chamá-lo de mentor.

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Assim como em 2012, você programou uma peça curta do estoniano Arvo Pärt ao lado de uma sinfonia do Bruckner. Enxerga relações entre os dois? Ambos são muito conectados pela profunda fé cristã e pela maneira como deixam isso claro na música. Pärt tem influência de Bruckner tanto na faceta instrumental quanto na coral. As obras dos dois criam atmosferas perfeitas para serem ouvidas em catedrais, nas quais o som tem bastante espaço para reverberar, e por isso a Sala São Paulo possui uma acústica adequada para que se possa tocá-los.

Você e o Antonio Meneses já se apresentam juntos há algum tempo, não? Se não me engano, a primeira vez foi em 1998, com a Osesp, antes mesmo da inauguração da Sala São Paulo. E a peça que apresentamos foi exatamente esta do Elgar. Depois disso chegamos a fazer juntos grande parte do repertório para violoncelo, dos concertos de Dvorák e Haydn até Don Quixote, de Strauss, e trabalhos dos contemporâneos Alfred Schnittke e Edino Krieger. O mais curioso é que o Meneses foi integrante da OSB quando ainda era muito garoto, com 14 anos, antes de ir morar na Alemanha para estudar e continuar a carreira.

Por vários anos o Concerto para Violoncelo de Elgar ficou relacionado à gravação da inglesa Jacqueline Du Pré, até pela biografia triste dela [Du Pré sofria de esclerose múltipla e encerrou a carreira antes dos 30 anos]. A peça já pode ser ouvida hoje em dia sem que nos lembremos tanto daquela interpretação? A versão dela marcou muito essa obra, de fato, e ajudou a firmá-la no repertório. Mas um dos baratos da música erudita é justamente a chance de ouvir interpretações diferentes. Sei que algumas pessoas ficam incomodadas quando a versão soa diferente do disco que elas têm em casa, mas são as novas leituras que levam a tradição adiante. O Meneses toca esse concerto brilhantemente bem.

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