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Giovanni Bruno morre aos 78 anos

Dono do Il Sogno di Anarello e um dos pilares da cozinha cantineira deixa um vazio na gastronomia paulistana

Por Arnaldo Lorençato
Atualizado em 20 jan 2022, 10h24 - Publicado em 29 ago 2014, 23h00

A foto acima foi feita na noite da última quarta-feira (27). Sempre cheio e barulhento, o salão de oitenta lugares do Il Sogno di Anarello estava dolorosamente silencioso. As garrafas de chianti revestidas de palha, as plantas de plástico, as muitas camisas de times de futebol e as centenas de fotos dos clientes ilustres pareciam não fazer sentido sem o magnetismo contagiante de seu proprietário, o italiano Giovanni Bruno, o Giovà, morto aos 78 anos, no dia anterior, em consequência de uma cardiopatia.

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Mais do que um dos pilares da cozinha cantineira, Giovanni foi um personagem da cidade, cuja trajetória se confunde com a própria história da gastronomia paulistana. Nascido em Casalbuono, cidadezinha de Salerno, ele veio para cá em 1950, com 14 anos. Seguia os passos do pai, que chegara pouco antes, fugindo de uma Itália devastada pela II Guerra Mundial.

Não tardou para que o rapazote conseguisse emprego no Gigetto, lavando pratos e descascando batatas. Só depois de uma década foi promovido a garçom, e é aí que começa a surgir o mito Giovanni Bruno. Dono de grande simpatia, todos queriam ser atendidos por ele. Como os pratos eram finalizados na mesa, acredita-se que nessa época ele tenha criado a mais emblemática receita cantineira, o molho à romanesca, mistura de creme de leite, cogumelo-de-paris, ervilha e cubos de presunto cozido, servido com o capelete de carne.

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Após dezessete anos como garçom, sem ter como prosperar, Giovanni resolveu, com outros três colegas, abrir o próprio restaurante, uma casa com o nome Giovanni Bruno. Para isso, o quarteto comprou a Cantina do Joelio, na Rua 13 de Maio. A festa de inauguração, em 20 de dezembro de 1967, mereceu chamada de capa no Jornal da Tarde. No ano seguinte, um tombo: ele e os sócios tiveram de deixar o imóvel, que ia ser demolido para a ampliação da rua. Por sorte, conseguiram arrematar o Panela de Ferro, na Rua Santo Antônio, também na Bela Vista. Outra fatalidade levaria Bruno a se mudar. Um bife à parmigiana esquecido no forno iniciou um incêndio que destruiu o local.

 

Mais uma vez, a fortuna voltou a lhe sorrir. De mudança para Salvador, o empresário italiano Giovanni Cinque havia acabado de pôr à venda o elegante Le Arcate, restaurante na Rua Martinho Prado, e o ofereceu em suaves prestações a Bruno. Nascia mais um sucesso, que durou até 1979, quando foi passado adiante por desentendimento entre os sócios. Nesse momento, Bruno resolveu ser dono do próprio nariz e abriu, sozinho, uma cantina na Rua José Maria Lisboa, no Jardim Paulista.

Como numa pegadinha, ao colocar seu nome na fachada, descobriu que perdera o direito de uso. Assim, surgiu o Il Sogno di Anarello, derivado de um apelido que Bruno ganhara do diretor teatral Antunes Filho, um grande amigo. Essa não seria a última parada do restaurante. Em 1983, o aluguel provocou uma nova mudança, dessa vez para um imóvel de sua propriedade, um casarão na Rua Timbuí, 58, na Vila Mariana, onde está até hoje e deve ser reaberto normalmente na segunda (1º) pela família.

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Coisa raríssima de acontecer, a pedido de alguns vereadores, o então prefeito Jânio Quadros rebatizou a via com o nome do restaurante, em 1987. Apaixonado por ópera, o entusiasmado Giovà costumava arriscar no meio do salão algumas árias de composições de Puccini, como La Bohème, sua favorita. Também soltava Champagne, hit romântico dos anos 70 na voz de Peppino di Capri. Com frequência, era acompanhado pelos clientes na cantoria. Uma festa!

No auge da fama, esse torcedor fanático do Palmeiras participava de programas de esporte na TV e inspirou um personagem de telenovela. Também chegou a organizar grandes eventos. Em um deles, o aniversário de 70 anos do empresário Victor Civita, fundador da Editora Abril, preparou o jantar no Círculo Militar de São Paulo, servindo 400 espaguetes ao sugo. Benfeitos, os pratos de Bruno nunca foram excepcionais. Mas tinham um condimento que transforma qualquer receita trivial em iguaria: uma dose contagiante de amabilidade. Por isso, eram irresistíveis.

Giovanni Bruno - Ed.: 2389
Giovanni Bruno – Ed.: 2389 ()
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