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Youtubers: ganhos altos, fãs apaixonados e convites para TV e cinema

Kéfera Buchmann, uma das mais bem-sucedidas estrelas do site de vídeo, tem quase 9 milhões de inscritos em seu canal

Por Tatiana Izquierdo e Bárbara Öberg
Atualizado em 1 jun 2017, 16h04 - Publicado em 9 jul 2016, 00h00

Moradores de um prédio nos arredores da Mooca, na Zona Leste, esbarram com frequência em fãs histéricos que parecem saídos de um clube de admiradores dos cantores Justin Bieber e Kate Perry. Os adolescentes apertam o interfone, fazem plantão na calçada e gritam o nome da estrela do 14º andar: Kéfera Buchmann, de 23 anos. Trata‑se de uma das mais populares youtubers (como são chamados os autores de conteúdo no YouTube, o maior site de vídeos da internet) do país.

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A devoção é tanta que a curitibana, moradora da cidade desde 2014, circula em eventos com seguranças e evita locais públicos. Por isso, costuma manter‑se reclusa em seu apartamento, onde, até poucos meses atrás, aparecia na varanda a fim de acenar para os súditos, hábito que suspendeu. “Eles querem manter contato de todas as maneiras, mas parei de dar tchauzinho para eles não ficarem passando perrengue na rua.”

Nas redes sociais, Kéfera arrasta multidões. São 7,4 milhões de seguidores no Instagram, 6,6 milhões no Facebook, 1,6 milhão no Twitter e 1 milhão de visualizações por post no Snapchat, marcas recordes por aqui para uma webcelebridade. Todos vieram na sequência dos vídeos publicados por ela desde 2010. Na primeira postagem, feita no próprio quarto, expunha com um texto esperto o ódio pelas barulhentas vuvuzelas.

Ela estudava teatro na época e apostou que, por meio da plataforma, poderia ser descoberta como atriz de TV (ainda pensa em fazer novela). Os adolescentes adoraram e hoje há perto de 9 milhões de inscritos em seu canal 5inco Minutos, o terceiro maior do país, atrás apenas do humorístico Porta dos Fundos (12,2 milhões) e do comediante Whindersson Nunes, do Piauí (9,8 milhões).

O foco são temas do cotidiano de seu público, como a insegurança de se maquiar em casa, o desejo de responder o que pensa ao professor sem filtros e uma série de situações escatológicas, tudo com humor ligeiro e vocabulário boca‑suja. “No começo, usava esse meu jeito bruto, com palavrões, como proteção. Nunca imaginei que seria minha marca registrada.”

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Os “kelovers”, como se autoproclamam, são bem jovens: 46,1% dos espectadores têm entre 10 e 24 anos e 67% pertencem ao sexo feminino. Graças a eles, Kéfera é um fenômeno ímpar fora do mundo digital. Estima-se que ela tenha faturado ao menos 3 milhões de reais nos últimos doze meses (ela não confirma os valores). A garota cobra cerca de 65 000 reais por um post patrocinado no Instagram e 250 000 reais para merchandising em vídeo. Entre os itens com sua marca estão caderno, camiseta, batom e esmalte, que ela aprova um a um. “Só não pega mais contratos porque se tornou tão grande que costuma demorar semanas para aprovar um produto e, às vezes, desaparece no meio do caminho”, diz um profissional do meio.

Escola Internacional de Alphaville
Escola Internacional de Alphaville ()

A joalheria Monte Carlo, que a incluiu em uma série de pulseiras assinadas por cinco famosas da internet, não tem do que reclamar. “A pulseira da Kéfera foi um enorme sucesso e tivemos de fazer reposição do estoque”, conta o gerente de marketing Fabrizio Galardi. O lançamento do acessório de 620 reais, em fevereiro, arrastou 5 000 fãs afoitos ao Shopping Eldorado. Em outubro, a expectativa é que esse potencial se multiplique nas salas de exibição do filme É Fada!, comédia produzida pelo global Daniel Filho.

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No enredo, filmado no Rio de Janeiro, a youtuber fará o papel-título da criatura mágica que ajuda uma garotinha. Esse sucesso se repete nas livrarias. Muito Mais que 5inco Minutos, da editora Paralela (braço pop da Companhia das Letras), uma espécie de diário autobiográfico, vendeu 400 000 exemplares desde julho, o que rendeu a ela algo em torno de 1 milhão de reais. Nos próximos dias, será aberta a pré-venda de seu segundo livro, Tá Gravando. E Agora?. O título mostrará dicas para bombar na internet. “Não pode ter preguiça de editar e cuidar bem da parte estética, senão ninguém tem vontade de voltar”, aponta um dos conselhos de Kéfera.

Bruna Louise
Bruna Louise ()

O tema da nova obra tem ótimo potencial. Hoje, basta a mais simples das câmeras e acesso à internet para se tornar youtuber. A Escola Internacional de Alphaville, com mensalidade de mais de 4 000 reais para o ensino médio, montou em maio um estúdio para os alunos, como atividade extra. Ali são ministradas aulas de produção de roteiro, edição de vídeo e de mercado audiovisual para a internet. “Sabemos que já virou uma profissão, e engana-se quem acha que é um ofício fácil”, comenta Ricardo Chioccarello, diretor da instituição. O resultado é uma fila de espera para usar o espaço.

A estudante Carol Botti, de 16 anos, foi uma das selecionadas para o curso. Ela almeja montar um canal com temas variados, de maquiagem a comportamento, mas ainda não se sentiu apta a estrear. “Tenho receio do que as pessoas vão falar”, pondera. Quem decide levar a batalha a sério sabe que é preciso persistência. A esmagadora maioria dos videomakers nunca vai dar em nada, é verdade, mas o caso do campeão Whindersson Nunes é inspirador. “Eu fiquei uns quatro anos falando para 1 000 pessoas assistirem, até emplacar com uma paródia.” Hoje, ele atinge quase 10 milhões de pessoas.

A publicitária Ana Carolina Rodrigues espera por esse momento. Criou há sete meses o canal As Marias, dedicado a temas femininos, e amealhou apenas 400 assinantes, mas não desanima. “A meta é fazer conteúdo de qualidade e viver disso.” O cinéfilo Marcelo Silva, do canal Pós Créditos, passou da marca dos 3 000 com suas postagens sobre longas e mantém a esperança. “Quero transformar isso em meu emprego oficial.” A astróloga Carol Vaz, do Papo Astral, ficou animada ao saltar, em doze meses, de 14 000 para 217 000 inscritos. Ela começou em 2013, e, no ano seguinte, trocou Tocantins por São Paulo para frequentar cursos na área. 

Essa migração é comum entre os nomes do setor. Pedro Rezende, do canal Rezende Evil, especializado no jogo de videogame Minecraft, prepara‑se para fazer o mesmo. Com 7,5 milhões de seguidores, ele procura apartamento aqui para deixar a cidade de Londrina, no Paraná, a fim de se aproximar de eventos e outros compromissos. “É preciso se dedicar muito. Trabalho mais de dez horas na frente do computador para postar, se possível, vinte vídeos por semana.”

Carol Vaz
Carol Vaz ()

Ele não comenta valores, mas estima‑se que fature ao menos 120 000 reais mensais só nas exibições. Essa renda varia de acordo com uma série de fatores, como o total de reproduções, curtidas no conteúdo e o tempo de permanência do espectador (confira mais detalhes em reportagem de VEJA desta semana). Para quem é convidado a tocar projetos no mundo real, como Kéfera, o céu das cifras é o limite.

Nesse aspecto, nenhum fenômeno se compara ao da Galinha Pintadinha, de desenhos animados musicais. É o campeão absoluto de visualizações (3,6 bilhões) e os produtos licenciados, produzidos por sessenta empresas, superam o total de 1 000 itens. O repasse do site pela participação em publicidade, que passa dos 200 000 reais mensais, representa apenas 20% do faturamento da marca (isso mesmo, é um negócio superior a 1 milhão de reais a cada trinta dias).  Por isso, seus criadores não pensam em deixar a plataforma tão cedo.

Carol Botti
Carol Botti ()

“Ganhamos mais do que pagariam para exibir na TV”, diz Juliano Prado, sócio do amigo Marcos Luporini na empreitada. O humorista Maurício Meirelles, que integrou o elenco do CQC, da Band, vê maior popularidade na web. “As pessoas me abordam mais para falar do meu projeto na internet do que das minhas participações na TV.”

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MAURICIO MEIRELLES
MAURICIO MEIRELLES ()

Christian Figueiredo, criador da página Eu Fico Loko, estreou em maio um quadro no Fantástico, da Globo, de mediação de conflito entre adolescentes e suas famílias. Autor de dois livros e com um filme a ser rodado pela Universal no fim do ano, ele tem aprovado a experiência. “Ela me trouxe um novo público.” Para atrair o interesse da TV, nem é fundamental cruzar a marca do milhão de seguidores. A atriz Bruna Louise, do Desbocada, com 869 000 inscritos, foi convidada para um teste como apresentadora do Vídeo Show, da Globo, e acabou contratada pelo canal a cabo Multishow. “Você chama atenção se consegue mostrar bem sua personalidade.”

Será o canal Sony, porém, a fazer o maior mergulho nessa área. A empresa prevê para 23 de agosto a estreia de um reality show de youtubers com o provável nome de Entubados. Oito figuras de destaque da rede, em fase final de acerto de contratos, passarão dois dias por semana hospedados em uma casa-estúdio na Vila Leopoldina, onde exibirão a rotina do trabalho. “As crianças de hoje não querem mais ser a próxima Gisele Bündchen, mas youtubers de sucesso”, diz a autora da ideia, Daniela Busoli, dona da produtora Formata. “Meus filhos, com 7 e 9 anos, têm essa vontade e serviram de inspiração.”

Quem chegou lá tem como novo filão as casas de shows. Elvis Patez, diretor artístico do Tom Brasil, conta que pensou duas vezes antes de trazer esses ídolos que não cantam nem dançam para ficar diante dos 2 000 assentos da casa. Pedro, do Rezende Evil, fará três apresentações, nas quais levará para o palco o cenário dos games. No dia 24, as sessões das 14 e 17 horas já estão esgotadas e uma terceira, às 20 horas, foi aberta para suprir o público. “São centenas de meninas gritando, algo impressionante”, relata Patez, que planeja um festival com várias figuras da plataforma em novembro.

Autora da peça de teatro Confissões de Adolescente, que originou livro e filme, a escritora e atriz Maria Mariana viveu fenômeno semelhante nos anos 90 ao ser porta-voz das aflições da turma dessa faixa etária, com relatos autobiográficos de assuntos bem semelhantes aos que recheiam os vídeos bombados de hoje. “Meu pai chamava de beatlemania, tínhamos fãs em porta de hotel, em todo lugar.”

Atualmente, suas filhas, entre 9 e 16 anos, adoram Kéfera e já pediram para ir a eventos para conhecê-la, poder “beijar, abraçar”, repetindo a identificação que ela viveu no passado. Para os rostos conhecidos desse fenômeno e as pessoas que desejam imitar o exemplo, cabe um cuidado especial com tamanha exposição, diz Maria Mariana. “Você acaba se tornando um personagem de si mesmo em uma idade na qual nem sabe ao certo quem é.”

[Colaboraram Larissa Faria, Juliene Moretti e Tatiane Rosset]

 

 

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