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Maternidades atendem cada vez mais gestantes refugiadas e imigrantes

Os hospitais na Vila Clementino e no Belenzinho concentram o atendimento a grávidas estrangeiras que chegam ilegalmente ao país

Por Mariana Oliveira
Atualizado em 1 jun 2017, 16h13 - Publicado em 15 abr 2016, 00h00

Grávida de nove meses, Kiazadioko Ngiezi Antonio, de 29 anos, deixou a cidade de M’Banza Kongo, no norte de Angola, e cruzou o Atlântico de avião rumo a São Paulo em março deste ano. Instalada na casa de uma conterrânea na metrópole, procurou a Cáritas, instituição que acolhe expatriados, atrás de orientação sobre onde conseguir um local seguro para o parto. Recomendaram-lhe seguir para uma maternidade no bairro de Vila Clementino, a Amparo Maternal.

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Em 15 de março, ela deu à luz Ebenezer Sangi Izabel, em um parto normal conduzido pelos profissionais dessa unidade de saúde na Zona Sul. “O atendimento foi muito bom e não houve nenhum problema com que me preocupar”, conta Kiazadioko, com seu sotaque de português de Portugal. Como não têm residência fixa, a menina e a mãe ainda estão hospedadas no local, em um centro de acolhida, amparadas por médicos e assistentes sociais. Elas podem ficar por lá até setembro. “Quero trabalhar com estética e criar Ebenezer aqui”, sonha. “Vim sem ter a mínima ideia do que iria encontrar, mas certamente as condições são melhores do que no meu país.”

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Surgida há 76 anos, a maternidade da Amparo Maternal realiza por mês cerca de 600 partos. Em 2014, foram 1 508 atendimentos a imigrantes. Agora, só os três primeiros meses deste ano somam 457. Boa parte das pacientes chega até ali orientada por entidades que abrigam refugiados com dificuldades econômicas. Outras mulheres, porém, conhecem o lugar por meio do boca a boca. No centro de acolhida, capaz de atender 100 mães, que podem permanecer ali por todo o período de gestação e por até seis meses após o nascimento do bebê, elas recebem alimentação e moradia e participam de aulas de costura, maquiagem e português. “A ideia é prepará-las para enfrentar uma nova realidade depois da gestação e colocá-las em um patamar diferente”, explica o médico Newton Tomio Miyashita, diretor técnico da Amparo.

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A maioria delas é da África, como é o caso da também angolana Bibicha Mutabunga, 34 anos, mãe de Alegria, de 3 meses. O nome da filha não foi escolhido à toa. “Em 2015, passei por muitos sofrimentos, e a bebê veio para me trazer alegria”, diz. A congolesa Elyse Ibambu, de 31 anos, é sua colega de quarto. Arriscando poucas palavras em português, ela precisa da ajuda das amigas para contar sua história. “Saí fugida porque meu marido estava sendo perseguido”, afirma a ex-vendedora de frutas e mãe de Jephthe, de 2 meses. “Ele sumiu, e decidi vir sozinha para o Brasil.”

Maternidades mães imigrantes
Maternidades mães imigrantes ()

Ter um filho nascido aqui agiliza o processo que as famílias do exterior enfrentam para regularizar sua situação. Com o registro civil em mãos (feito agora no próprio hospital), as estrangeiras ganham salvo-conduto para não ser deportadas. Dados da Polícia Federal mostram que a curva migratória continua apontando para cima. Em 2015, nada menos que 118 309 estrangeiros começaram a viver legalmente no país, depois de entrar como clandestinos. Esse número é 57% superior ao registrado em 2011. Somente em São Paulo, foram 24 095 ocorrências do tipo no ano passado, sendo que 40% dos imigrantes são mulheres.

No Belenzinho, o Hospital Maternidade Leonor Mendes de Barros, do governo estadual, é também muito procurado por grávidas vindas de outro país. Dos aproximadamente 5 000 nascimentos registrados anualmente, perto de 1 000 são de filhos de estrangeiras. A maioria das mães é boliviana (o que corresponde a cerca de 80% das pacientes naturais de outro país). Elas chegam de forma ilegal para trabalhar nas fábricas têxteis do Pari, bairro próximo ao hospital. Com medo de ser deportadas, evitam procurar atendimento médico no período pré-natal. Só vão à maternidade ao ser encaminhadas por organizações como a Pastoral do Imigrante. Apesar da predominância andina, é cada vez mais comum ver pelos corredores chinesas, angolanas e paraguaias, por exemplo.

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A mudança do perfil populacional exigiu algumas adaptações na dinâmica do complexo. O corpo clínico, que recebeu treinamento para comunicar-se em espanhol e aymara (um dos dialetos na Bolívia), enfrenta agora um cenário mais diversificado. “A nossa primeira ação envolveu acrescentar ao guia de orientação às pacientes uma tradução em inglês, espanhol, francês, mandarim e árabe sobre o nosso trabalho de UTI neonatal, área na qual somos especialistas”, afirma o médico obstetra Corintio Mariani Neto, diretor da maternidade na Zona Leste.

A educadora Ana Paula Malheiro Chambingo procurou o hospital quando estava com uma gestação de sete meses. Seu medo, na época, era sofrer alguma complicação na gravidez. “Quando saí de Angola, desconfiava que o bebê estivesse com problema no coração, por isso vim para cá.” Sua menina, Massoma, nasceu saudável no começo de abril e a família planeja o futuro por aqui. Para o atendimento a pessoas como ela, a maternidade conta ainda com um grupo de 160 voluntárias. São elas que lidam diretamente com as mães e asabastecem com roupas e itens de higiene pessoal. “É aquele algo mais que não vemos na maioria dos hospitais públicos”, orgulha-se Mariani Neto.

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