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Professor confundido com ladrão é linchado e preso em São Paulo

André Ribeiro treinava corrida quando foi espancado pela vizinhança. Ele conseguiu ser solto após dar uma aula sobre Revolução Francesa a um dos bombeiros que o socorreu

Por Nataly Costa
Atualizado em 5 dez 2016, 14h20 - Publicado em 1 jul 2014, 15h29

A tragédia do Guarujá – onde uma dona de casa foi linchada até a morte após ser confundida com uma sequestradora de crianças – quase se repetiu em São Paulo na semana passada. O professor de história André Luiz Ribeiro, de 27 anos, corria seus dez quilômetros diários pelas ruas do extremo Sul da capital quando foi acorrentado e espancado por moradores que o confundiram com um ladrão. 

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A história começou por volta das 19 horas do dia 25 de junho, quando o bar do comerciante Djalma dos Anjos foi assaltado na Rua Doutor João Baptista Gomes Siqueira. Com o filho a tiracolo, a vítima saiu em busca do ladrão. Não demorou muito para avistar Ribeiro, que passava correndo pela rua usando roupa de academia: camiseta, short e tênis próprio para exercícios. Em alta velocidade, o fusca do comerciante quase o atropelou. Ribeiro levou as mãos ao alto, achando que seria assaltado. “Eles não falaram nada e começaram a me bater. Me deram um mata-leão e não tive mais forças. De repente, foram chegando umas quinze, trinta pessoas, não lembro ao certo. Só via pernas. Todo mundo começou a me espancar.” 

Já caído no chão, Ribeiro viu o dono do bar pegar uma corrente no carro e amarrar suas mãos e pernas. “Você já viu O Homem Elefante? Foi o que aconteceu comigo. Fiquei como um bicho”, diz, referindo-se ao filme de 1980 do diretor David Lynch que conta a história de um homem com uma deformidade facial grave que é exposto em circos como uma aberração. Além das dores no corpo e da situação humilhante, Ribeiro começou a achar que não sobreviveria ao linchamento quando ouviu alguém do grupo gritar: “Pega o facão”.

Aula de Revolução Francesa

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Nesse momento, um carro do Corpo de Bombeiros passou pela rua e parou. A turma de linchadores se dispersou, sobrando apenas Ribeiro, o dono do bar e seu filho, que iniciaram a agressão. Um dos bombeiros ouviu toda a história – o comerciante dizia ter certeza de que aquele era o ladrão, enquanto Ribeiro insistia que era apenas um professor de história da Escola Estadual Professora Juventina Domingues Marcondes de Castro, com alunos de sétima e oitava séries. “Eu estava sem documento, eles não acreditaram. Nem tiro a razão deles, moro na periferia e sei como é”.

Ainda na dúvida, um dos bombeiros lançou a prova de fogo: se ele era professor, que desse uma aula sobre Revolução Francesa ali mesmo. “A Queda da Bastilha, no dia 14 de julho de 1789, foi determinante para a ascensão da burguesia francesa como classe política dominante, já que até ali eles já exerciam poder econômico. O lema Liberdade, Igualdade e Fraternidade…”, ensinou Ribeiro, ou Professor Andrezão, como é conhecido entre os alunos adolescentes. 

Mesmo convencendo os bombeiros, Ribeiro foi levado para a delegacia. Por causa do depoimento do dono do bar, ele ficou duas noites preso, uma delas em uma cela minúscula dividida com outro detento. Foi transferido para uma maior quando seu advogado trouxe seu diploma de ensino superior. Só foi solto quando a mulher do comerciante prestou depoimento dizendo que, talvez, Ribeiro não fosse realmente o ladrão do bar. Ainda assim, ele responde em liberdade provisória um processo por roubo. 

Nesta terça-feira (1), às 18 horas, familiares e amigos do professor organizam um protesto contra a injustiça em frente ao 101º DP, onde Ribeiro ficou preso. Apesar dos hematomas – ele ainda sente muitas dores de cabeça e tem lesões nas pernas e braços -, ele diz que o trauma ficou no passado. “Alguns amigos falaram para tirar uma licença, mas não quero. Vou voltar a dar aula, que é o que eu amo fazer. Meus alunos precisam de mim.”

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