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Gilberto Kassab: Um jeito ioiô de administrar

Nos últimos dois meses, o prefeito Gilberto Kassab mudou de opinião em relação a pelo menos três medidas polêmicas: a restrição aos fretados, o corte na merenda das crianças e a redução dos gastos com coleta de lixo

Por Henrique Skujis
Atualizado em 5 dez 2016, 19h08 - Publicado em 26 set 2009, 18h57

Voltar atrás em uma decisão nem sempre é sinal de fraqueza. Pode ser uma atitude nobre, de quem reconhece um erro. Ou uma manobra estratégica – ao perceber que a determinação não foi bem recebida, recua-se para evitar danos ainda maiores. A mudança de planos pode ser movida também por uma eventual, e muitas vezes bem-vinda, negociação entre as partes envolvidas. No caso do prefeito Gilberto Kassab, que durante a semana, pela terceira vez em menos de dois meses, deu a mão à palmatória e desfez o que estava feito, parece haver um misto de tudo isso.

Na última quarta-feira, após uma enxurrada de críticas, Kassab desistiu de cortar 20% dos custos com a varrição das ruas e 10% dos com a coleta de lixo. A prefeitura gasta 27,5 milhões de reais por mês com a limpeza da cidade e a medida seria responsável por uma economia de 3 milhões de reais. Segundo o secretário de Serviços, Alexandre de Moraes, o ajuste, anunciado em meados de agosto, seria necessário por causa da crise econômica mundial, que teria causado queda na arrecadação. Em nota oficial, a administração municipal explica que a reviravolta deu-se após um “diálogo mantido entre as partes” – no caso, a prefeitura e as sete companhias contratadas para o trabalho. É óbvio, no entanto, que a repercussão negativa pesou. Duas empresas haviam demitido quase 600 garis e divulgado que não teriam como manter a qualidade de seus serviços. A cidade sofreria as conseqüências. E sofreu. No dia 8, um temporal inundou a capital e trouxe à tona todo o lixo deixado para trás. “A cena de sacos boiando durante uma chuva é cruel para um prefeito”, afirma o cientista político Marco Antonio Teixeira, da Faculdade Getúlio Vargas (FGV). Ao anunciar o recuo, Kassab culpou as chuvas fora de época – “Temos de ter sensibilidade para este fato” – e falou em recuperação na arrecadação.

 

Há duas semanas, a mudança de rumo se deu em um terreno tão ou mais pantanoso. A Secretaria de Educação definiu o corte de cinco para quatro refeições diárias nas 292 creches municipais. O motivo do regime forçado seria a diminuição da permanência das crianças sob os cuidados da prefeitura, de doze para dez horas. “Faz tão mal à saúde comer demais como comer de menos”, justificou Kassab, à época. Quatro dias antes de a ideia entrar em vigor, ele deu novamente o braço a torcer. A despeito da redução da carga horária, as 60.000 crianças de 1 a 6 anos atendidas nas creches voltaram a ter café da manhã, lanche, almoço, lanche da tarde e jantar. “Em uma cidade na qual as crianças vão às creches principalmente por causa da merenda, foi um erro político”, diz Teixeira. Na última quinta-feira, a colunista Dora Kramer, do jornal O Estado de S. Paulo, fez uma análise bastante apropriada dos casos. Para ela, o governador José Serra teria determinado os sucessivos recuos. “Serra não assume a candidatura, mas não dá um passo, nem permite que os aliados façam quaisquer gestos que, na visão dele, possam render prejuízos eleitorais”, escreveu.

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A postura ioiô de Kassab está em grande parte ligada às medidas adotadas pelo secretário faz-tudo Alexandre de Moraes, que, além de ser titular de Serviços e cuidar da pasta de Trans­portes, é o presidente da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) e da SPTrans. Quando ele deu início à restrição que tiraria cerca de 1 400 fretados de uma área de 70 quilômetros quadrados do centro expandido entre 5 e 21 horas, no final de julho, mostrava-se irredutível. Empresários do setor e usuários protestaram com veemência. Um dia depois, os ônibus foram autorizados a trafegar e encostar nas avenidas Doutor Chucri Zaidan e Luís Carlos Berrini. O consentimento teria sido necessário por causa da acanhada largura das ruas perpendiculares às avenidas e pela falta de metrô na região. Algo que um planejamento mais adequado teria evitado, lógico. De acordo com Oded Grajew, coordenador do Movimento Nossa São Paulo, negociações são elogiáveis, mostram humildade e tendem a revelar uma gestão democrática, “mas recuos como esses podem indicar falta de um diálogo maior com a sociedade e com as partes envolvidas”. Para a prefeitura, não há recuo, não há falta de diálogo, não há lapsos administrativos e muito menos interesses políticos, como aventa a oposição. Segundo setores de oposição, os cortes no orçamento – que no final das contas nem ocorreram – teriam como objetivo engordar os cofres públicos no próximo ano eleitoral. “Com os bolsos cheios, ele conseguiria inaugurar mais obras em 2010”, acredita o vereador José Américo (PT), que sabe do que fala, pois no âmbito federal o governo de seu partido está agindo exatamente assim.

A gritaria em torno das medidas tomadas por Kassab deve continuar. Mesmo após a manutenção da verba destinada à varrição, as cinco empresas que prestam o serviço não haviam anunciado, até quinta-feira passada, a recontratação dos funcionários demitidos. Apesar das alegações de que o orçamento estava curto por causa da crise, em agosto o prefeito propôs uma reforma administrativa que pretende elevar os salários dos 27 secretários municipais de 5.300 para 21.500 reais e dos 31 subprefeitos de 6.700 para 18.500 reais. Se aprovados pela Câmara Municipal, os reajustes custarão em torno de 800.000 reais por mês aos cofres públicos.

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