Reunir a família nem sempre é fácil. Quando um pode, para o outro é impossível. Depois de várias tentativas, as duas filhas, a mãe, os genros, o tio e uma amiga da família conseguiram chegar a Campos do Jordão para uma semana de alegre convivência. Era um lindo chalé no alto da montanha, do pai de um dos genros. A mãe comentou, precavida:
– Acho bom botar o tio no sótão. Ronca muito.
– E você, que parece um motor a diesel? – revidou o acusado.
Todos riram. O tio, é claro, foi exilado no sótão. Saíram para jantar.
– Férias! – suspirou a mãe.
No centro, o trânsito estava pior que o da Marginal Tietê às 6 da tarde. Tudo parado. Empilhados em um único carro, tipo jipão, todos se remexeram.
– Para que se preocupar? Não temos hora!.– disse a mais nova, sorridente, como se congestionamento fosse um programaço.
– Seria mais fácil se você tivesse emagrecido! – disse a mãe para sua melhor amiga.
– Não vou me magoar. Você está nervosa com a plástica, que ainda não cicatrizou – retrucou gentilmente a outra.
Vários restaurantes lotados. Quando havia mesas, faltavam lugares.
– A gente se aperta – propôs o genro mais jovem.
Sentaram-se, encavalados. O menu demorou cinco minutos. Já os pratos…
– Será que foram pescar a truta? – lamentava-se o mais velho.
O tio acusou a mãe.
– É culpa dela, que pediu mudanças na receita!
– Eu não suporto cebola!
A família encarou a acusada, como se fosse a culpada por tanta fome.
– Saio na rua e como um sanduíche! – ameaçou ela.
– Ninguém brigou. Você está nervosa por causa da plástica – martelou a amiga.
– Quer fazer o favor de não falar mais da minha plástica?
Tentaram mudar de assunto. O tio insistiu.
– Esconder é impossível! Parece oriental, de tanto que puxou os olhos!
Horas depois, de barriga cheia, resolveram caminhar.
Aí reside um grande mistério. O paulistano adora fugir da cidade em busca de tranqüilidade. Quase enlouquece se a tranqüilidade é muita. A família sorriu feliz diante das lojas e shoppings, abertos na temporada. Correram para comprar chocolates, uma obrigação em Campos. Malhas. Logo, a grande descoberta: uma loja especializada em brasões.
– Vamos fazer o da nossa família! – vibrou a mais velha.
– Sobrinha, meus avós vieram no fundo de um navio. Brasão para eles era a enxada! – lembrou o tio.
A moça torceu o nariz, irritada. Adeus à esperança de um sangue azul!
– Ai, que frio! – gemeu a amiga.
De fato, batiam o queixo. Voltaram às pressas. A mãe fez chocolate quente. Deitaram tarde. Deliciados com o frio.
Manhã linda. Cada um acordou com calma, em seu horário. A mãe esquentava leite, fazia café. O tio suspirou.
– Estou doido por uma macarronada. Aquela ótima que você faz.
Ela caiu na armadilha, orgulhosa.
– Deixa comigo!
Imediatamente, filhas e genros se arrumaram para sair.
– A gente vai dar uma volta – disse a mais velha. – Deixei os pacotes de macarrão na sacolinha do supermercado porque tive preguiça de guardar ontem à noite.
– Eu vou ficar sozinha?
– É melhor não tomar sol enquanto a plástica não cicatriza – lembrou o genro mais novo.
– Mas… mas…
Solidária, a amiga ficou junto. Os casais foram passear. O tio pegou um livro e se deitou na rede. As duas se atracaram com as panelas. Elas, que no dia-a-dia nunca pegavam no pesado! Ambas se encararam, já pensando no jantar, nos outros almoços…
– Quando eu voltar, vou ter de tirar férias das férias! – lamentou-se a mãe.
Em temporadas familiares, é sempre a mãe que paga o pato.