Revistas da semana retrasada mostraram imagens da descoberta de três buracos negros em atividade na Via Láctea, aqueles que engolem estrelas, gases cósmicos e toda matéria próxima. Em São Paulo, as imagens chocantes foram as de um buraco cinzento a engolir caminhões, automóveis, microônibus, tonéis, muros – e pessoas, vidas, bens, amores, amparo, amizades, esperanças.
Duelo de competências
Engenheiros da obra calavam-se, à espera de laudos e instruções que deveriam vir de cima; engenheiros não envolvidos na obra apareceram de dedo em riste na televisão e nos jornais. Uns moderados, como o vice-governador, ao dizer que a engenharia “em algum momento falhou”; ou como o que disse, considerando as condições do terreno, que “faltou prudência”. Outros, mais duros, disseram que a falha “mancha a imagem da engenharia brasileira no exterior”; que há “indícios de erro grave”; que os bônus referentes a prazos, no contrato, estimulam a pressa e a “ganância”.
Desastres em obras sempre houve e haverá. Muitas vezes, ligados à imprevidência e à incompetência.
Aí me lembrei de um caso, que não tem nada a ver. Ou talvez tenha. É como uma conversa: um caso puxa outro. Um trágico, outro apenas pitoresco. O cérebro é um computador que não funciona como computador: acessa um site sem alguém clicar a tecla. Estimulado pela palavra incompetência, ele me trouxe a história do Exclusive. Conto.
O Exclusive tem esse apelido porque usa muito a palavra “exclusive”, e a usa como se fosse “inclusive”, neste sentido. Não deve saber a diferença.
Ele estava trabalhando na obra de um amigo meu, cirurgião plástico de ótimo humor, dono de um repertório inesgotável de casos e pessoa de bons hábitos, entre os quais o vinho diário. Fazia parte da obra, no bairro do Brooklin, o aproveitamento de uma antiga dependência da fazenda que havia no lugar para uma cave, uma adega. Em cima ele construiria um salão para degustar vinhos e acompanhamentos, receber convidados etc.
Um engenheiro amigo dele achou prudente construir a laje do piso com trama de ferro e cimento, tudo calculado. Meu amigo julgava que bastariam vigas de ferro apoiadas sobre pilares, pois as paredes eram daquelas antigas, de 2 palmos de largura, mas acatou a sugestão. Mandou a planta para o engenheiro calculista recomendado e uma semana depois passou o projeto para o Exclusive.
Ele pegou aquilo, sentou, olhou, estudou e disse:
– Tá errado.
Mas como, não pode ser, e coisa e tal, e isso aqui foi engenheiro que fez, os caras estudaram para isso etc. e tal.
– Se quiser que faça assim eu faço, exclusive vai tomar mais tempo, porque vai ter de desmanchar, mas eu faço.
Que fizesse. E fez.
– Os ferro tá pronto. Mas tá errado. Posso fundir? Quando tirar as escoras, vai cair.
Meu amigo achou melhor chamar o engenheiro e o calculista. Recalcularam, subiram lá, conferiram cada ponto da amarração. A estrutura batia com o projeto, certinho.
– Toca – disseram.
– Vai cair – preveniu o Exclusive.
Qual era o problema? Foram lá conversar com ele, planta na mão, sapiência na atitude. Exclusive mostrou, satisfeito por perguntarem, pela primeira vez:
– Aqui não tem apoio. Vai cair. Aqui no fundo já tem, não precisa. Aqui na frente é que tem de ficar.
Olharam a planta, horrorizados. Os lados estavam trocados.