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Cursinho: professores cantam, tocam e simulam experiências

Para manter alunos atentos, eles apostam em seus talentos

Por Cynthia Grilo
Atualizado em 5 dez 2016, 19h23 - Publicado em 18 set 2009, 20h34

O professor de português Eduardo Calbucci entra na sala de aula carregando seu violão. Senta-se em um banquinho na frente da lousa e começa a dedilhar Feitiço da Vila, de Noel Rosa. Os cerca de 180 estudantes do curso pré-vestibular Anglo ouvem atentos. “Toda aula ficamos curiosos para saber que música ele escolheu e que ponte vai fazer com a matéria”, diz Mariana Vieira, que pretende cursar Medicina. “Graças a essas conexões, conseguimos aprender com mais facilidade.” Prender a atenção de dezenas de jovens que passam horas a fio entre livros e apostilas é um desafio e tanto. Por isso, os professores precisam se desdobrar. Além de tocar violão e cantar, Calbucci, por exemplo, tem sempre à mão CDs de música popular brasileira. Formado em jornalismo e com especialização em semiótica da canção pela Universidade de São Paulo, Calbucci dá aula há treze anos e é uma das estrelas dos cursinhos atualmente. Faz parte de um grupo que consegue aliar conhecimento com uma, digamos, performance diante dos alunos. “Além de ensinar a matéria, quero aumentar o repertório cultural da turma”, conta. A música não vale só para o português. Nas aulas de física de Isaac Almeida, do Objetivo, ela serve para criar um certo suspense. “Onde está a imagem?/ Onde está a imagem que ninguém viu?/ Ela sumiu, ela sumiu?/ Não! O seu paradeiro é atrás do espelho…” Com esses versos de sua própria lavra, Almeida – que por causa do tipo físico é chamado de “Eddie Murphy” nos corredores do cursinho – começa a aula de óptica. Físico, com pós-graduação em matemática pura, o professor tem no currículo outro curso que o ajuda na hora de usar o vozeirão: composição e regência. Além de quebrarem a tensão, as canções fazem com que a classe participe mais. O professor Almeida, que dá palestras sobre metodologia de ensino, chama atenção para a necessidade de interligar conhecimentos. “Se o aluno vai mal em interpretação de texto, não irá bem em física, já que terá dificuldade em entender o enunciado dos problemas.” Para Pierluiggi Piazzi, professor de física do Anglo, o segredo de uma boa aula está em trazer as teorias para o cotidiano. “Sou adepto de um provérbio chinês que diz: ‘Se ouço, esqueço; se vejo, entendo; se faço, aprendo’ “, explica Piazzi. Para a aula de constante elástica, ele distribui elásticos comprados em uma lojinha de 1,99 real. A moçada, claro, se diverte com o estica-e-puxa. “Quando eles praticam, não esquecem, porque saíram do abstrato para o real.” A estratégia de tirar o aluno do plano das idéias agrada também ao professor Luís Fernando Pereira, o “Lula”, que ensina química no Intergraus. “Trago diversas substâncias e faço experiências para eles visualizarem o que estou falando.” É comum os alunos se assustarem quando algo explode ou pega fogo. Tudo controlado, claro. Lula ainda se vale das técnicas que aprendeu em cursos de oratória, como mudanças no tom de voz e na expressão facial. Com ibope alto entre os vestibulandos, esses professores são disputados e se transformam em chamarizes dos cursinhos. Chegam a receber 80 reais por hora-aula, um valor oito vezes maior que o do piso de um professor de ensino médio de escola particular. Muitos escrevem as apostilas e ganham comissão pelas vendas. Para Eduardo Calbucci, o fato de os alunos estarem atrás de um sonho (passar no vestibular) colabora para que o astral das aulas seja melhor do que nos colégios tradicionais. “Nossa relação é diferente”, diz. “Não estamos na classe para avaliar, mas para enfrentar um inimigo comum, que é o examinador.” Embora os métodos didáticos variem, uma coisa é certa: o modelo aula-show tão difundido nos anos 80 – com muita bagunça e pouco conteúdo – caiu por terra. “Antes o professor que sabia fazer gracinha podia até não ser tão bom na matéria”, afirma Lula. “Hoje o vestibular exige muito mais dos estudantes, e não podemos ficar só na decoreba.”

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