De vez em quando os amigos me escrevem para compartilhar exemplos do inglês utilizado no Brasil. Há desde frases engraçadas e improváveis até nomes de estabelecimentos um tanto quanto pomposos. Cai na última categoria o caso enviado por e-mail na semana passada. Alguém pergunta se pode um empreendimento imobiliário paulistano ter um “esthetic beauty salon chic”. Nessas horas, sinto-me como o Arnaldo César Coelho, o ex-juiz que hoje comenta jogos de futebol junto com Galvão Bueno na Rede Globo. Sempre que suspeita de uma infração das regras do jogo, o narrador indaga ao parceiro: “Pode isso, Arnaldo?”. E este dá a sua opinião com frases engraçadas.
Dia desses, passei para a frente um “tuíte”, acrescido da pergunta retórica: “Pode isso, Arnaldo?”. Qual não foi minha surpresa ao receber uma resposta — do próprio Arnaldo César, com direito a uma fotinha do ex-árbitro. O texto dizia o seguinte: “A regra é clara, se pode, pode; se não pode, não pode mesmo!”. Recuperado do susto, dei-me conta de que nada mais era do que uma pegadinha do próprio computador, que havia feito uma pesquisa automática em busca da frase “Pode isso, Arnaldo?”. O comentarista não havia visto minha pergunta na internet e respondido a ela, como pensei num primeiro momento. De qualquer forma, passei a seguir seu perfil no Twitter (o do Arnaldo verdadeiro, claro).
Mas no caso do inglês falado no Brasil a regra não é tão clara assim. Vale tudo, ou quase. Desde que me mudei para São Paulo, em meados da década de 80, o idioma de Shakespeare se aproxima da gente. É a telefonia, a TV por assinatura e, sobretudo, a internet. A paisagem linguística da nossa cidade — e mesmo a do país — é diferente hoje da que havia quando cheguei. Faz todo o sentido chamar de “fazer topless” o ato de tomar sol sem a parte de cima do biquíni. Incorporamos esse anglicismo sem pestanejar. Não conseguiríamos sequer dizer “tetas ao léu” com seriedade. Mas é como se descreve a mesma prática em Portugal. Será que o Brasil está mais próximo da cultura americana do que da dos portugueses?
Aqui se faz dos idiomas o que se quer. O fato é esse. Seja ele o de Camões ou o de Beyoncé. Há o exemplo do velho e ótimo “x” do “x-salada”, produto da equação x = cheese =queijo. É o som, no caso, que cria o sentido. É uma criação perene. Foi adotada em campanha publicitária pela rede americana de hambúrgueres Burger King, numa vitória clara para o português brasileiro. Quem estivesse na internet depois da partida entre Grêmio e Corinthians, na semana retrasada, encontraria outro exemplo genial: a hashtag #patofail. Ela descreve, com perfeição e crueza, em nove toques do teclado, a maneira infeliz com que o centroavante bateu o último pênalti do jogo, desclassificando da Copa do Brasil o meu time.
Essa destreza com a língua inglesa nós achamos normal. Faz parte do português do Brasil e de São Paulo. Quando é inteligente e funciona, dá um toque coruscante ao nosso idioma. Do contrário, é apenas pretensiosa. A regra é essa, vai ver.
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