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Paulistanidade

Por Mário Viana
Atualizado em 27 dez 2016, 18h30 - Publicado em 15 abr 2016, 00h00

Sabe aquelas trinta pessoas que nasceram mesmo em São Paulo? Eu sou uma delas. Não vou entrar em detalhes insignificantes, como há quanto tempo e tal, mas posso garantir que, na minha infância, fazia frio de verdade no inverno e a gente era obrigado a ir para a escola de luvas e gorrinho de lã tricotado por uma tia. Sim, as tias da minha infância sabiam tricotar!

Não acredito que apenas o fato de eu ser nascido nos cafundós do Jaçanã (no Jardim Brasil, para ser bem específico) tenha animado o pessoal da VEJA SÃO PAULO a me convidar a ocupar esta página. Afinal, nascer na cidade não faz de ninguém um autêntico paulistano. Ivan Angelo, com quem tenho a alegria e a honra de dividir o condomínio deste espaço, é mineiro de Barbacena e descreve como poucos nativos as peripécias da Pauliceia.

É nisso que venho pensando desde o convite: o que faz de mim um paulistano? Ser corintiano ajuda, claro, mas não basta. Gostar de pastel de feira conta ponto? Provavelmente. Transformar a pizza do domingo à noite em um ritual quase místico deve ser critério de paulistanidade. E, se você condenasse às chamas do inferno o herege que colocou ketchup na redonda, deveria receber medalha de honra ao mérito dada pela Câmara dos Vereadores em sessão solene.

Muitos acham que o critério gastronômico define um paulistano, mas a coisa vai muito além de uma mesa de restaurante. Tudo bem, inchamos o peito ao falar de um muquifinho sensacional no Pari onde se come a melhor esfiha de zátar do mundo e até tratamos o restaurante mais caro da capital com a maior intimidade, mesmo sem nunca termos passado na calçada. A refeição e todos os seus derivados — bebidas, petiscos, paqueras — estão no DNA do paulistano, nativo ou adotado, mas há mais recheio nessa empadinha.

Ser paulistano talvez se traduza no prazer de caminhar pela Paulista todo domingo, curtindo muito as pessoas que ocupam o asfalto com bikes, skates, patins, cachorrinhos, trombones e fantasias. Também vale muito caminhar pela avenidona a qualquer hora de qualquer dia. De manhã, quando estações de metrô despejam milhares de pessoas a caminho do escritório ou do futuro emprego. Ao meio-dia, quando turmas imensas vão rapidinho almoçar, voltando depois bem devagar, empatando a vida de quem está com pressa. De madrugada, quando a calçada ganha tribos mais jovens, encantadas por descobrir o Baixo Augusta e seus porões mágicos.

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Paulistano também pode ser quem curte passear no Ibira, no Villa-Lobos ou mesmo no Trianon ou no Jardim da Luz. Quem chorou ao ver o Museu da Língua Portuguesa pegar fogo. Quem fica cheio de si ao assistir a um concerto na Sala São Paulo. Quem curte as telas do Almeida Júnior na Pinacoteca ou desfruta o silêncio do Museu de Arte Sacra. Quem recomenda o Museu do Futebol ao gringo perdido na rua sem saber direito aonde ir. Quem consulta o roteiro e fica em dúvida entre centenas de filmes, shows e peças de teatro. Saber que existe de tudo para todos na metrópole dá aquele conforto que só se encontra dentro de casa.

É isso. São Paulo é minha casa — e essa frase, para um canceriano, é valiosíssima. Vamos arregaçar as mangas e começar uma nova função com tantas letrinhas, palavras, acentos e sotaques. Coisa bem de paulistano. Ah, ia esquecendo: muito prazer, Mário.

mario@abril.com.br

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Mário Viana

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