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Corinthians: aqui tem um bando de loucos

Com mais de 14 milhões de torcedores no estado, o Corinthians tem simpatizantes, fãs e seguidores tão fiéis que são capazes de desvarios pelo time

Por Maurício Teixeira
Atualizado em 5 dez 2016, 18h50 - Publicado em 30 abr 2010, 21h10

Confira cinco figuras que se destacam nas arquibancadas:

 

‘Matou’ a tia e foi ao Mundial

Rodrigo Maizza era um sobrinho dedicado e um funcionário “quase” exemplar na semana em que o Corinthians chegou à final do Mundial de Clubes da Fifa, em 2000. “Eu tinha uma tia muito doente, já desenganada, que morava na minha casa”, lembra. Ele queria muito assistir ao jogo no estádio, mas surgiu um problema: a partida seria no Rio de Janeiro, em uma sexta-feira, e seu chefe não admitia faltas ou atrasos. Dois dias antes, na madrugada da quarta-feira, a tal tia não resistiu e morreu. Para resolver alguns problemas burocráticos, Maizza atrasou-se na entrada do trabalho. “Meu chefe era meio durão, já chegou brigando comigo”, conta o programador de computadores, atualmente com 34 anos. Ele então contou sobre a morte e o chefe disse que ele nem deveria ter ido trabalhar. “Juro que não foi premeditado. A inspiração me veio na hora e falei: ‘Vim porque na sexta preciso ir a Nova Odessa resolver uns problemas da casa que minha tia tinha por lá’.” Autorizado a sair do trabalho, ele comprou a passagem. Para o Rio, é claro. Campeão e feliz, Maizza voltou na segunda-feira para trabalhar normalmente. “Na primeira banca de revistas que encontrei, bati o olho e vi um pôster do Corinthians. E não é que eu aparecia na foto?” Estava no meio da multidão, mas poderia ser reconhecido facilmente. “Se alguém da empresa viu, não falou nada.” Hoje, em outro trabalho, todo mundo sabe de sua paixão pelo clube e da história da tia. “Aqui é mais tranquilo. Já avisei que se o Corinthians for para a final da Libertadores, eu estarei lá, sem precisar matar nenhuma outra tia.”

 

Uma lenda viva da Zona Leste

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A dona de casa Geni Santiago de Almeida, de 88 anos, não lembra ao certo quando viu o Corinthians se apresentar no Pacaembu pela primeira vez. “Mas foi muito antes da construção do tobogã”, diz, sobre a parte da arquibancada erguida em 1970, onde antes ficava a concha acústica. Amigos estimam que foi na década de 50 que Tia Geni, como ela é conhecida, começou a frequentar os jogos do clube. “Naquela época não havia mulheres no estádio nem divisão de torcida”, conta. “Meu marido dizia que queria uma companheira para todos os programas e não uma empregada que só ficasse em casa.” Tia Geni é tratada entre os corintianos como uma lenda viva. O respeito e a admiração fazem com que sua casa, na Vila São Matheus, Zona Leste, com o muro sempre pintado com símbolos ligados ao Timão, seja uma espécie de atração turística local. Mesmo após ficar viúva, há mais de vinte anos, seguiu frequentando o Pacaembu, a Fazendinha e os ensaios da Escola de Samba Gaviões da Fiel. Começou desfilando na ala das baianas e hoje faz parte da velha-guarda. “Conheci vários lugares no Brasil por causa dessa paixão.”

 

“Eu me arrepio no Pacaembu”

Aos 7 anos, Guilherme Bara entrou em campo como mascote, ao lado de Sócrates, numa partida do Corinthians contra o Santos, em 1984. Aos 14, ele perdeu totalmente a visão devido a uma retinose pigmentar, doença degenerativa nas células da retina. Hoje, aos 32, coordenador de marketing de uma empresa do setor químico, Bara continua acompanhando o Corinthians. “No Pacaembu, eu sinto a vibração da partida”, diz. “É o chão que treme, o grito da torcida quando a bola passa raspando, a explosão na hora do gol. Fico arrepiado.” Com o radinho de pilha como companheiro, ele costuma ir ao estádio cerca de dez vezes por ano, sempre escoltado por amigos. “Ouvir o rádio em casa me deixa muito apreensivo.” Bara já passou por apuros, como na partida em que o Corinthians foi eliminado da Libertadores pelo River Plate, em 2006. Após a derrota por 3 a 1, alguns torcedores tentaram invadir o gramado e tiveram de ser contidos por policiais. “Lembro do tumulto, do empurra-empurra, do aperto para sair. Quando isso acontece, eu tenho de confiar muito nos amigos e tomar cuidado como outro torcedor qualquer”, afirma o corintiano, que confessa não contar todos os detalhes para a família. “Eles não precisam saber de tudo.”

“El el el, o alemão é da Fiel”

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Foi ao ouvir o coro acima que o francês — isso mesmo, francês, não alemão — Bertrand Cocallemen se apaixonou pelo Corinthians. “Eu gostava pouco de futebol na França, mas, quando entrei naquele ônibus rumo ao Estádio do Morumbi, tudo mudou.” Cocá, como é conhecido, deixou a França aos 11 anos. Nunca tinha estado em um estádio quando, dois anos após sua chegada, marcou de ir com um amigo ao clássico entre Corinthians e Santos. “Era um jogo tenso, cercado de policiais montados, sirenes, corre-corre, gritos, tumulto”, lembra. “O clima era assustador, inclusive dentro do ônibus, já que as pessoas estavam penduradas para fora, batendo na lataria.” No estádio, o choque continuou. “Devo ter perdido 80% da partida, pois fiquei assistindo à torcida.” Ele considera aquela experiência definitiva para seu corintianismo. “Era o começo dos anos 90 e tudo apontava para que eu virasse são-paulino, já que o clube tinha um time fantástico.” Hoje, o publicitário de 33 anos é uma espécie de embaixador do clube para seus amigos estrangeiros. “Para todos que vêm me visitar, eu dou um jeito de colocar no roteiro um jogo no estádio”, revela Cocá, que acredita que só assim pode fazê-los entender esse sentimento. “É uma coisa para viver e não para explicar.”

Torcedor muito organizado

O corintiano costuma dizer que “é a torcida que tem um clube e não o clube que tem uma torcida”. Ernesto Teixeira leva a frase mais a sério do que os outros. O torcedor, de 45 anos, é daqueles que não se contentam em ficar apenas na arquibancada. “Meu pai era santista e não me deixava ir aos jogos do Corinthians. Vai ver que vem daí a minha inquietação”, conta. Em 2002, Teixeira resolveu organizar uma partida entre os jogadores que disputaram o histórico Corinthians x Ponte Preta de 1977. Missão cumprida, criou e atualmente preside o Comitê de Preservação da Memória Corinthiana (CPMC), que nasceu para resgatar ídolos, histórias, reunir a bibliografia do Corinthians (com cerca de setenta livros) e até promover campanhas como a “Corinthiano com H”, que prega o uso do “H” na grafia da palavra. “Queremos resgatar a tradição do passado para que os torcedores dos próximos 100 anos possam olhar como foi rica nossa história.” A ideia de atuar com mais força no Corinthians começou na década de 80. “Eu era office-boy e comprei o título do clube em nem sei quantas vezes”, lembra. “Levei dez anos para ter dinheiro e começar a pagar a mensalidade”, diz Teixeira, que, além de compositor e puxador de samba, tem dois empregos durante o dia. “Lembro quando eu vi o Basílio pela primeira vez almoçando no refeitório. Foi como encontrar um semideus.” Seus dois filhos, Mateus, de 15 anos, e Tiago, de 18, estão nas categorias de base do Timão. O mais velho participou da Copa São Paulo de Juniores. Depois disso? “Às vezes a gente pensa, né? Seria bom ser presidente do clube.” Que ninguém duvide.

+ Confira todas as matérias do especial ‘Corinthians: Uma Paixão que se Renova’

 

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