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Camelo, gato & posturas

Por Walcyr Carrasco
Atualizado em 5 dez 2016, 19h46 - Publicado em 18 set 2009, 20h17

Decidi aprender ioga a sério. Fiz outras tentativas no passado, sem sucesso. Houve uma escola adepta do método acelerado: a professora erguia a cabeça, eu ainda estava no pé. Se levantava, eu deitava! Desisti na primeira aula! Outro professor exigia:

– Pule como o macaco! Bata no peito. Pode grunhir!

– Ron, ron, ron!

– Não é felino, é símio. Grrrrrr… Faça grrrrrr.

Fugi!

Mas o tempo é um inimigo dos boas-vidas! Minha coluna dói. Quando me curvo, não toco o chão.

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– Precisa de alongamento – diagnosticou um amigo.

O namoro com a ioga recomeçou. Optei por um personal trainer da área. Veio Luís, um rapaz de cabelos longos, sandálias e o olhar demorado no horizonte, adepto de um guru indiano.

– Não quero a parte mística, só a física – expliquei.

– São indissolúveis, porque a energia deve ser compartilhada com o universo.

Concordei: uma dose de alto-astral não me prejudicaria.

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Com as palmas e calcanhares unidos, entoou:

– Ommmmmmmmmmmmmmmmm.

– Ôôô… ôômmm – fiz eu.

E começamos! Cabeça girando, ombros para trás, para a frente, de pé sobre uma perna, a outra, inspira, expira, transpira! Quase caí de nariz no chão umas vezes, mas fui em frente. Gotas de suor pingavam da minha testa. Pensei: “Se suo, faz bem!”.

Finalmente o mestre parou. Sorriu. Devolvi o sorriso, exausto. “Para a primeira aula, até que fui bem”, deduzi. E ele:

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– Agora que terminamos o aquecimento, vamos às posições!

– Oh! – surpreendi-me.

Quis gritar por socorro, enquanto ele me fazia ficar de joelhos, curvar a coluna, empinar o traseiro, erguer a cabeça e botar as mãos no chão.

– Esta é a posição do gato – explicou.

“Só se for do gato bravo”, refleti.

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Depois tive de botar o pescoço para trás, o tronco para a frente. Era o camelo. Provavelmente durante uma travessia no deserto, sem água. Finalmente, nos sentamos de pernas dobradas. As dele encaixadas uma na outra. “Será que eu consigo?”, perguntei-me. Puxei um pé. Ouvi o rangido dos ossos, mas fui em frente. Depois o outro. A perna estalava. Não sei como, consegui cruzar as duas, enfiar um pé embaixo do outro. A coluna ficou reta! Todo o corpo puxado como um elástico. Eu me senti um faquir!

– Não force – avisou o mestre.

– Está legal, eu me sinto ótimo! – menti, embora os músculos parecessem cordas de violão, de tão esticados.

Respiramos. Quer dizer, ele respirou. Eu absorvia e lançava golfadas de ar. Em seguida, suavemente, ele deslizou uma perna sobre a outra, desfazendo a posição. Puxei um joelho. Nada. O outro. Também não! Eu tinha dado um nó com as pernas! Agarrei um pé e puxei. Quase caí para trás, mas o pé continuou encaixado!

– Algum problema? – perguntou o professor, após meditar um pouco de olhos fechados.

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– Tem uma chave de fenda?

– Respire! Relaxe!

Ele puxou uma perna. Eu a outra. Novos rangidos. Enfim, as enferrujadas dobradiças dos meus ossos se abriram. As pernas se soltaram, enquanto eu rolava no chão.

– Vamos relaxar – ele propôs.

“Ih… Agora vem bomba.” Pensei em fugir, mas mal conseguia me mover. E lá fui eu. Joelhos dobrados, topo da cabeça no chão, mãos e calcanhares erguidos e a coluna curva como um tamborim. Pronto para rugir, respirei fundo e… que sensação maravilhosa!

– É a posição de adoração! – ele explicou.

Quando avisou que a aula estava encerrada, eu continuava com a cabeça virada no chão. Realmente, adorei! Agora não perco aula! Mesmo que, eventualmente, ainda vá precisar da chave de fenda!

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