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Fernando Haddad, o filósofo da 25 de Março

Perfil do candidato do PT à prefeitura

Por Mauricio Xavier
Atualizado em 5 dez 2016, 16h44 - Publicado em 19 out 2012, 16h34

Fernando Haddad circulou anônimo pela região da Rua 25 de Março por doze anos. Começou a trabalhar em 1981 na Mercantil Paulista de Tecidos — a loja de seu pai, o libanês Khalil Haddad, na Rua Comendador Abdo Schahin —, aos 18 anos de idade. Descontado o período entre 1985 e 1989 (quando teve uma construtora e foi analista de investimentos do antigo Unibanco), esteve atrás do balcão do negócio da família até sua extinção, em 1997. Na última segunda (15), ele retornou ao epicentro do comércio popular paulistano e tudo foi diferente. Sua agenda de campanha previa uma caminhada de cinco minutos do Pátio do Colégio à 25 de Março, onde haveria um “minicomício”. Mas, cercado por uma multidão de jornalistas, correligionários e curiosos que faziam os pedidos mais estapafúrdios — entre eles, um homem com dreadlocks que gritava “Haddad rastafári, olhe para a África!” —, foi impossível percorrer os 300 metros da Praça Padre Manuel da Nóbrega e do calçadão da Rua General Carneiro. No empurra-empurra, não conseguiu dar vinte passos. Desistiu e fez o percurso de carro.

+ Os candidatos por trás do paletó

Nem os quase sete anos como ministro da Educação deixaram seu rosto tão conhecido quanto os dois meses de propaganda política na TV. Até agosto, ele ainda era confundido na rua com Gabriel Chalita, candidato do PMDB que ficou em quarto lugar no primeiro turno. A recente exposição é o fato novo em uma vida relativamente pacata. Haddad cresceu no Planalto Paulista, ao longo dos anos 60 e 70, em uma família de classe média. Passou a infância andando de bicicleta e jogando taco. Integrante da colônia libanesa, tornou-se sócio do Sírio, e lá, no verão de 1980, conheceu Ana Estela, com quem se casaria oito anos depois. Apaixonado por matemática, Haddad pensava em ser engenheiro. “Mudei de ideia quando meu pai quase perdeu a casa da família em um negócio por falta de conhecimento jurídico”, conta. Assim, em 1981, entrou na faculdade de direito da USP, no Largo São Francisco. A época, para ele, ficou marcada pelo estudo e pelo início de sua trajetória política. “Ele era daqueles alunos que sempre me procuravam depois da aula para pedir indicação de livros”, lembra o jurista Dalmo Dallari, professor no 1º ano do curso e um de seus mentores. Em 1985, Haddad tornou-se presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto, sucedendo no cargo àquele que se tornaria seu melhor amigo, o jornalista Eugênio Bucci. “Fernando tinha prática na administração da loja do pai e usou isso para botar ordem nas desorganizadas contas do grêmio. Pode-se dizer que a 25 de Março foi sua principal escola”, afirma Bucci.

Veja 10 curiosidades sobre o PETISTA:

1- É faixa preta em tae kwon do. “Mas não pratico há dois anos por causa de uma lesão que sofri no joelho direito durante um treino.” Na adolescência, lutou kung fu

2- Jogou handebol pelo Esporte Clube Sírio e chegou a ser vice-artilheiro do campeonato paulista entre 1977 e 1978

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3- Seu apelido de infância era Dandão, uma variação de Nandão e Fernando

4- Ana Estela já era Haddad antes de se casar, embora eles não fossem parentes. “Ficamos amigos na juventude por causa da coincidência do sobrenome”, diz ela

5- Chocólatra, sua marca preferida é a suíça Lindt. Mas evita comprar

6- Aprecia variados tipos de queijo, que não costumam faltar na geladeira de sua casa

7- Seus animais preferidos são os grandes felinos. “Acho que é por causa do seriado Tarzan, que eu via muito quando era criança”

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8 – É alérgico a perfume, que não usa

9- Frequenta shows internacionais que vêm à cidade, como os de Paul McCartney e Eric Clapton

10- Nas férias, sempre prefere ir à praia. Em geral, costuma viajar para o litoral da Bahia

Formado em direito, Haddad cursou mestrado em economia e doutorado em filosofia, ambos na USP, onde se tornou professor de ciência política em 1997. Iniciou em 2001 a carreira na gestão pública, como chefe de gabinete da Secretaria Municipal de Finanças, ocupada por João Sayad na gestão de Marta Suplicy. Em 2003, mudou-se para Brasília — trabalhou no primeiro escalão dos ministérios do Planejamento e da Educação, até assumir essa última pasta em 2005. Ficou marcado pela criação do ProUni — que concede bolsas de estudo em faculdades a estudantes de baixa renda — e também por falhas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Em 2009, houve vazamento de provas. Em 2010, erros de impressão.

 

Com um patrimônio declarado de R$ 473.000,00 — que inclui um apartamento no bairro do Paraíso e um Ford Ecosport 2006 —, Haddad é “o estereótipo do professor universitário”, segundo pessoas próximas. Em casa, lê muito e toca violão. Fora de lá, caminha pelo bairro e vai a cinemas e restaurantes, dos quais geralmente não lembra o nome. “Qual é mesmo aquele japonês que fica numa esquina?”, pergunta a seus assessores, que consultam o Google Maps para encontrar o Kinoshita, na Vila Nova Conceição. Na ponta da língua, só a lanchonete Joakin’s, no Itaim, que frequenta desde a adolescência. Também não é inclinado a compras. “Vou uma vez por ano a um shopping qualquer, entro numa loja da Richards e resolvo minha vida por um ano, o mais rápido possível”, explica.

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Entre a família e os colegas, é conhecido por ser bastante desligado. “Não posso contar com ele para levar um papel em algum lugar, sempre esquece”, entrega Ana Estela. “Não é que seja avoado, mas fica concentrado em suas tarefas e esquece o resto.” Um episódio, que virou piada entre seus amigos, ilustra esse estilo “viajandão”. Em 1995, quando cursava o doutorado em filosofia e lia, fascinado, Economia e Sociedade, obra fundamental nas ciências so ciais, do alemão Max Weber, chegou em casa e anunciou, desconsolado:

— Roubaram meu livro.

— Onde ele estava? — perguntou Ana.

— No carro.

— Quebraram o vidro e pegaram o livro?

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— Não, levaram o carro.

— Então quer dizer que roubaram o nosso carro!

O Santana nunca mais foi encontrado. E, para desespero de Haddad, nem o calhamaço de quase 500 páginas.

  • A São Paulo do PETISTA

 

“A AUSÊNCIA DA MARTA NA CONVENÇÃO ME DOEU”

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Qual é o grande orgulho de sua carreira política? O mais simbólico foi o ProUni. Pessoalmente, nem é a política pública que eu considero mais importante. Da minha passagem pelo Ministério da Educação, gostaria de ser lembrado no futuro pelo Plano de Desenvolvimento da Educação, porque é um conjunto de realizações. Mas o impacto e a repercussão do ProUni são muito maiores, e percebo isso na abordagem das pessoas, que vêm agradecer e dizer como a vida mudou após a oportunidade que receberam. Esse retorno estabeleceu uma espécie de “liga” entre o beneficiário e o gestor. Foi algo que ficou colado em mim, como uma identidade.

Em qual aspecto sua vice, Nádia Campeão, é melhor do que o senhor? As mulheres têm uma contribuição interessante para dar à política, elas sempre trazem um olhar diferenciado. Às vezes, apontam para um aspecto da questão que você não estava observando, e isso faz uma grande diferença na hora de formular um plano ou um programa.

Qual é a maior qualidade de José Serra? Obstinação.

Por que Celso Russomanno subiu tanto nas pesquisas de intenção de voto e por que caiu tão rapidamente? Ele cresceu numa faixa de vácuo que se abriu entre a rejeição à atual administração e o desconhecimento de alternativas a ela. Mas tem atributos pessoais, militou por uma causa considerada popular e era identificado como uma pessoa que lutava pelos direitos da população. Não tiro esses méritos. A queda veio com o debate político.

Qual foi o pior dia da campanha até agora? Senti falta da presença da Marta Suplicy na convenção que oficializou a minha candidatura, em junho. A ausência dela me doeu. E o primeiro Datafolha a gente nunca esquece (rindo). Em março, a pesquisa do instituto mostrava que eu tinha apenas 3% das intenções de voto. Subir de 3% para 5% não parece muito, mas é uma diferença enorme para quem tem 3%, você não faz ideia.

Dos pedidos que recebeu na eleição, qual foi o mais inusitado? Tem gente que pede ajuda financeira. No domingo (14), durante uma carreata na Zona Norte, um homem se aproximou, explicou que estava desempregado e falou: “Quero uma carroça para coletar material reciclável”.

Que foto mais o constrangeu? Segui a recomendação do presidente Lula de evitar os fotógrafos de jornais (risos). Saí em algumas fotos fazendo careta ou com o rosto meio torto, mas não me lembro de nenhuma específica.

Que palavra melhor define sua reação ao passar para o segundo turno: alívio ou desforra? Acho que alívio.

Em caso de vitória, de que forma pretende comemorar? Vou assistir à apuração, como fiz no primeiro turno, em uma sala reservada em algum lugar. Provavelmente será de novo no Hotel Pestana, na Vila Mariana. Apenas para ter um espaço onde as pessoas possam estar presentes.

Se não vencer, como será a primeira semana pós-eleição? Eu lido bem com essas coisas, não me preocupo muito. Vou me apresentar novamente na USP, minha obrigação profissional é voltar à universidade.

Onde São Paulo é menos São Paulo, para o bem ou para o mal? Eu fico chocado com palafitas, essas casas construídas sobre córregos, muito comuns na periferia. Não consigo admitir que uma criança more dentro de um córrego, não dá.

Qual é sua cidade predileta no exterior? No fim da década de 80, morei um ano em Montreal, no Canadá, quando estava me preparando para escrever minha dissertação em economia. Por isso, tenho uma relação afetiva com a cidade.

Quando chorou pela última vez? Eu faço isso frequentemente, sou muito emotivo. Na entrevista após o primeiro turno, fiquei embargado. Não chegou a escorrer lágrima, mas tive de me conter. Um dia desses chorei copiosamente ouvindo o violonista Raphael Rabello e lendo uma nota biográfica sobre ele. Sua morte, em 1995, foi uma tragédia (o músico era portador do vírus HIV e morreu em decorrência de uma parada respiratória).

 

 

 

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