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Por Arnaldo Cheixas
Terapeuta analítico-comportamental e mestre em Neurociências e Comportamento pela USP, Cheixas propõe usar a psicologia na abordagem de temas relevantes sobre a vida na metrópole.
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CONVIDADO EM TERAPIA: motivação para mudanças

Mudar hábitos não é tarefa fácil. Aprender a lidar com a motivação é essencial para se alcançar os objetivos de mudança, quando ela é necessária. O convidado de hoje traz algumas contribuições para nos ajudar a entender como usar a motivação para transformar nossos hábitos. Quero mudar! Mas não quero… (por Marco Antonio Abud) Gina […]

Por VEJASP
Atualizado em 27 fev 2017, 00h39 - Publicado em 1 set 2014, 15h44

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Mudar hábitos não é tarefa fácil. Aprender a lidar com a motivação é essencial para se alcançar os objetivos de mudança, quando ela é necessária. O convidado de hoje traz algumas contribuições para nos ajudar a entender como usar a motivação para transformar nossos hábitos.

Quero mudar! Mas não quero… (por Marco Antonio Abud)

Gina descobriu que tem diabetes e seu médico disse que precisa mudar seus hábitos de alimentação e se exercitar. Ela trabalha 10 horas por dia, assume muitas responsabilidades na manutenção da casa, é casada e tem 2 filhos. Não faz ideia de como vai inserir essas mudanças na sua rotina.

Gabriel faz uso de cigarro há 10 anos e isso incomoda muitos de seus amigos e tem atrapalhado seu relacionamento com a parceira que não fuma. Ele sabe o mal que faz para sua saúde, mas não se sente pronto para parar agora.

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Cristina se sente acima do peso. Já matriculou-se 3 vezes em academias e inicia 1 dieta nova por ano. Ela consegue cumprir suas metas durante alguns meses, mas vai interrompendo os novos hábitos gradativamente até largá-los totalmente e retornar à rotina antiga. Ela sente que nunca vai conseguir mudar.

Paulo faz uso de álcool aos fins de semana e fuma maconha todos os dias. Tem sentido mais dificuldade em se manter atento nos estudos e suas notas vem caindo. Tentou reduzir a frequência do fumo para 1 vez por semana, porém em 3 semanas já tinha voltado a fumar diariamente. Acha que precisa de uma mudança em seus hábitos, mas não gostaria de parar totalmente de usar maconha ou de beber.

Todo processo de mudança de comportamento é muito difícil, gera algum tipo de desconforto ou incômodo, mesmo que o resultado dessa mudança seja algo claramente melhor do que o estado atual. Existem vários mecanismos evolutivos e comportamentais que explicam porque nós tendemos a persistir nas atitudes “conhecidas”. Os hábitos têm o poder de persistir, é preciso muito menos esforço para manter uma rotina do que para mudá-la. Nos exemplos acima, podemos observar uma característica comum: os personagens apresentam dificuldade em abandonar prazeres e alívios a curto prazo em prol de valores e conquistas que acham importantes a médio e longo prazo. Uma das explicações para isso já foi abordada nesse blog: “nosso cérebro é mais sensível às consequências imediatas do nosso comportamento do que àquelas de longo prazo”. Ou seja, quanto mais rápido e intenso o prazer (ou o alívio) gerado por uma situação, e quanto menos esforço precisarmos realizar para consegui-lo, mais o nosso corpo tende a procurar tal situação. E vale ressaltar que essa tendência não passa por um pensamento racional. É biológica, instintiva. Objetivos mais duradouros, que normalmente exigem mais esforço, persistência, e que são atingidos a médio ou longo prazo, nesse mecanismo biológico, acabam perdendo força.

Quando se trata de substâncias psicoativas capazes de causar dependência (aqui entram desde itens conhecidos como tabaco, café, álcool, calmantes, anfetaminas, até “drogas famigeradas como maconha, cocaína, crack, heroína, opióides, ecstasy, entre outras) outros mecanismos também entram em cena. Sabemos que elas ativam, no nosso sistema nervoso, tanto regiões ligadas ao centros de recompensa e prazer como outras que fazem parte do processo de tomada de decisões e consolidação de memória. Essas “drogas”, além de causarem alívio e prazer por si só, também atuam de forma a promover desprazer em outras atividades antes prazerosas. Além disso, elas também ativam mecanismos cerebrais que fazem com que, mesmo nas pessoas que conseguem ficar um tempo sem usá-las, uma pequena “dose” cause uma “hipersensibilidade”, um prazer muito grande, com uma grande chance de “recaída”.

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E como podemos ser capazes de vencer tantas armadilhas biológicas e comportamentais? Como podemos mudar e persistir na mudança?

Aqui, acho que vale voltarmos à máxima de que cada indivíduo é único e não existe um tratamento ou estratégia que seja eficaz para todos. Isso é verdade para qualquer mudança de comportamento e mais verdadeiro ainda quando falamos em tratamentos para dependência de substâncias psicoativas.

Um conceito que é comum e fundamental a várias estratégias de mudança é o de “motivação”.

Existem várias definições de “motivação”.  Prefiro aquela que a descreve como a probabilidade de uma pessoa se envolver e persistir em uma estratégia específica de mudança.

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Assim, a motivação não aparece aqui como algo inerente da personalidade de alguém, nem como algo “sim ou não”. Não existe a pessoa “motivada” por natureza e não trabalhamos com a ideia de estar motivado x não estar motivado. Todos nós somos capazes de apresentarmos vários níveis de motivação para mudanças e esses níveis podem variar ao longo dos anos, dos meses, semanas, dias e até mesmo ao longo do mesmo dia.

Existem três elementos centrais da “motivação”: o desejo ou importância que damos à mudança, a confiança que temos na nossa capacidade de mudar e o quanto estamos prontos para agir.

Bom, se entendemos que qualquer mudança de comportamento é difícil e que a motivação é algo flutuante, dinâmico, podemos também entender uma outra característica que todos temos frente a qualquer mudança: a ambivalência. É comum, natural que uma parte nossa queira permanecer no comportamento antigo (por mais nocivo que ele seja), enquanto outra parte deseja a mudança e a conquista de objetivos duradouros.

O que fazer então para superar as dificuldades do processo de mudança, aumentarmos nossa motivação e lidarmos com a ambivalência?

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Não existe receita de bolo ou estratégia que funcione para todos. Contudo, algumas atitudes são muito úteis para o início e manutenção de um processo de mudança, tanto em nós mesmos como nas pessoas a quem queremos ajudar:

-Evitar olhar e enfatizar somente o que está errado: mudar é difícil, sempre há uma parte nossa que deseja permanecer no comportamento antigo. Apontar somente defeitos é natural quando vemos algo errado, mas muitas vezes pode nos desestimular quando ainda estamos em estágios iniciais de mudança;

– Encontrar nossa motivação interna. Iniciar qualquer modificação de hábito baseando-se exclusivamente em desejos e metas de outras pessoas é, além de artificial, ineficaz.  A motivação é algo presente em cada um de nós. Encontrarmos essa motivação, os valores que estão por trás do nosso desejo de mudar e deixá-los em evidência fortalece o processo de mudança.

– Aceitarmos as dificuldades de cada um. Não precisamos “aprovar” ou “concordar” com cada comportamento que foge do objetivo e, sim, acolher as dificuldades do processo.

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– Perceber a capacidade e o poder de mudar. O sentimento de ser apto para realizar ações diferentes é muito importante. Olhando para trás, podemos achar momentos em que atuamos de outras formas. Mesmo que esses momentos sejam poucos ou que tenham ocorrido há muito tempo, eles indicam o quanto se pode agir de formas flexíveis a cada instante.

Em outras palavras, a aceitação das dificuldades e da ambivalência da mudança, o fortalecimento das partes saudáveis de cada um e o cultivo de sentimentos de esperança e de capacidade individual são ferramentas muito poderosas para nos movermos em direção a objetivos importantes em nossas vidas.

Dr. Marco Antonio Abud Torquato Junior (CRM SP 129.339) é médico psiquiatra da Universidade de São Paulo, integrante do Programa de Acolhimento Relacionado ao Uso de Álcool e Outras Drogas (Acolhe USP) e atende em consultório particular. Contato: marcoabud@terra.com.br.

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